Individualmente, desde que nascemos
começamos a disputar, a ter atitude para conquistar ‘nossos’ espaços: no berço,
no seio da mãe, no meio familiar, na escola, entre os colegas, no emprego,... É da nossa natureza. Enfim, desde sempre
estivemos em estado de guerra com alguém, havendo ou não conflito.
Repudiamos e consideramos nosso inimigo quem
não reconhece os méritos que julgamos ter, quem não nos dá passagem no
trânsito, aquele condômino ou síndico que, nas reuniões de condomínio, não te escuta
ou não respeita suas opiniões, o colega que te sabota na empresa, o chefe que não reconhece efetivamente
a sua importância, e por aí vai. Entre
se sentir prejudicado e ir à luta, há um espaço muito pequeno. Esse espaço,
felizmente, quase nunca é ultrapassado, limitados que somos pela razão, pela
consciência das consequências.
Além disso, nem todos se sentem assim
ao mesmo tempo - o estresse de um é anulado pela tolerância do outro, e assim
vai. Pouco a pouco, com a experiência de vida, deixamos de registrar os ataques
a que somos frequentemente submetidos; vamos filtrando melhor as causas que
merecem que sacrifiquemos o nosso tempo, energia e que justifiquem que assumamos
os eventuais riscos a que estaremos expostos se formos tentar corrigir. Por segurança, passamos a evitar ambientes
de conflito, e procuramos seguir os caminhos mais seguros e pacíficos. É claro
que nem sempre isso é possível.
Uma outra opção, quase nunca praticada, é tentar entender o lado do ‘adversário’ – suas motivações, seus valores, e, quem sabe, concluir que ele, embora possa não ter razão, tenha motivos que justifiquem
o que fez/faz, e tudo bem. Isso é o
perdão. Porém, perdão para ter valor tem que ser verdadeiro, ou seja, não deve deixar resíduos de rancor, raiva, ódio. A propósito, não é demais lembrar a famosa
frase atribuída a Oscar Wilde:
“Nunca deixe de perdoar seus inimigos
- nada os aborrece tanto".
Em termos de sociedade, tem sentido a
afirmativa que diz que, para se superar tempos difíceis, são necessárias respostas coletivas. Recentemente, a primeira página de um grande
jornal aqui de São Paulo trouxe estampada uma foto com a seguinte legenda:
“Egípcio joga pedra contra policiais
em protesto que deixou dois mortos e 220 feridos no Cairo”.
Aquela foto passou o que aquele homem, maduro, sério, consciente,
vitima de um sistema opressor, com o braço erguido para atirar a pedra, estava
sentindo no momento. A mão que atira uma pedra contra os opressores, não atira
apenas uma pedra. Atira todo seu ressentimento, frustração, raiva, ódio, contra
aquele que limitou a sua liberdade, não respeitou a sua propriedade, a sua
integridade física, a da sua família, as suas opiniões,... São tantas as coisas
levadas por aquela pedra que alivia quem atira, machuca quem for atingido, mas é
não apenas isso. Este ato carrega toda uma carga de energia que alimenta a
nuvem da razão, que quando satisfeita, alimentará a esperança de sucesso e a geração de
novas ações que, pouco a pouco, poderão trazer para o povo
sofrido, para aquele pais, uma nova época, um novo e melhor momento.
No Brasil de hoje ocorre uma batalha
de verdade, com armas, mortos, feridos e centenas de ônibus que servem para o
transporte público incendiados. Essa batalha ocorre paradoxalmente nas chamadas
'favelas pacificadas', as quais os narcotraficantes começam a reconquistar das
mãos da polícia. O crime tentando subjugar toda uma sociedade carente, e a força
de policia constituída com a missão de protegê-la.
Quem está certo? Quem está errado?
Devemos fazer guerra, ou sermos passivos, tolerantes, e aceitar o que não
acreditamos, não merecemos, não queremos?
É difícil dizer. Entretanto, podemos ter certeza de duas coisas, valendo
para todos os envolvidos:
- Se houver chance de resolver o conflito mediante negociação, entendimento, sempre é a melhor opção, em relação ao conflito, à guerra. Os prejuízos e mágoas serão infinitamente menores.
- As batalhas e as vitórias mais importantes, são aquelas que sinalizam um novo e melhor recomeço. Não havendo esse objetivo, essa proposta, essa possibilidade, a batalha e a vitória perdem a razão de ser.