Parte I
Robert, um homem de cerca
de 70 anos, teve uma vida profissional satisfatória e produtiva. Mas, agora, em
decorrência da idade principalmente,
havia sido afastado compulsoriamente da última empresa onde trabalhara
por cerca de 25 anos, e onde, imaginava, iria ficar para sempre. Ledo engano –
nada é para sempre!
Tentou se recolocar
utilizando sua rede de contatos. Mas, nada do que foi oferecido lhe interessou.
É difícil regredir quando você, durante toda a sua vida, teve por princípio
progredir. Ficou atento às oportunidades fortuitas - afinal, até agora, tudo
sempre dera certo na vida dele. Mas,
incrivelmente, nada surgia. Parecia que o mundo conspirava contra ele.
A situação em que se
encontrava era agravada pelo fato de que agora, com seus rendimentos reduzidos,
não conseguia manter o padrão de vida anterior, e isso refletia na sua relação
familiar, com seus dependentes. Eles se afastavam indignados, considerando que
estavam como estavam –não podendo ter as mesmas coisas que tinham antes-,
devido à sua incapacidade de superar a situação. O que não deixava de ser
verdade... Além disso, devido estar com
o nível de audição reduzido, tinha dificuldade de entender o que diziam, de
interagir, e isso era considerado ofensivo por parte deles, que ficavam aborrecidos
por terem que repetir o que já haviam dito. Aos poucos, a comunicação entre
eles ficou limitada ao essencial.
Sua vida sexual estava
reduzida a zero, considerando que não tinha companheira nessa parte, e nem disposição para
sair a campo, conquistar, manter um caso. E, muito menos, para pagar por isso -
coisa que nunca fez. Sua autoestima nesse campo era mantida pela eventual ativação de suas
memórias eróticas, que o levavam a resgatar alguns momentos positivos e
prazerosos do passado.
Foi levado a se
conscientizar de que a possibilidade de voltar a trabalhar era remota, senão
impossível. Então, foi criando uma
rotina alternativa que o ajudava a passar o tempo, e que, de alguma forma, era
gratificante. Entretanto, embora evitasse pensar a respeito, isso não era
suficiente. Sua vida perdera o sentido -
precisava encontrar um caminho que, de alguma forma, o levasse a sentir que
estava realizando algo produtivo.
Com o passar do tempo,
foi deixando de fazer os exames indicados pelo seu médico, deixando ir ao
dentista, de tomar os remédios que lhe tinham sido receitados, de praticar os
exercícios físicos que lhe faziam tão bem, de ter uma vida social ativa,...
Enfim, estava se comportando como se seu ‘trem’ estivesse chegando na última estação,
onde pararia para sempre.
Num determinado momento Robert
tomou consciência de que esse comportamento só poderia levá-lo para aquela
‘estação’ mesmo. E era isso o que ele queria? Teria alguma forma de mudar esse
destino tão sem graça, perto daquilo que foi a história da sua vida?
Por outro lado,
lembrou-se que, ultimamente, teve um pensamento meio que recorrente de que, se morresse, seus problemas
estariam resolvidos.
Coincidentemente, na
sequência – semanas após – sofreu um assalto e reagiu de modo tão temerário que,
por muito pouco, não tornou realidade o que pensou. Aquilo nunca tinha
acontecido antes. Ele foi levado a concluir que o que aconteceu foi uma aviso,
uma mensagem, de que o que ele pensasse poderia se tornar realidade. Pouco
tempo depois, fazendo uma instalação de uma prateleira na casa de seu filho, um
pesado vidro caiu fazendo um buraco no piso onde ele, pouco antes,
estivera. Mais um aviso. Seu ‘pensamento’ estava próximo a se
concretizar.
Como mudar esse
pensamento negativo para algo positivo?
Precisava se concentrar, encontrar em alguma coisa diferente, algo que
desejasse sinceramente, mas que fosse positivo. Racionalizou que precisava
eleger um sonho, um ideal que - se implicasse em despesa-, fosse atrativo para
algum investidor, pois ele mesmo já não dispunha de nenhuma reserva. O quê poderia ser? Tinha essa dúvida, mas, de uma coisa tinha
certeza: ‘tinha que fazer alguma coisa, manter-se
em movimento’; acreditava na fala atribuída a Winston Churchil: ‘Se estiver
passando pelo inferno, continue caminhando.’
Nesse meio tempo teve
alguns sonhos recorrentes que o deixaram intrigado.
Num deles, estava numa
região à beira mar. Um braço de mar entrava na terra formando como que um
pequeno lago. De onde ele estava –sim ele sabia que era ele- numa elevação a
beira do lago podia avistar o lago, embarcações aqui e ali, e, no sentido em
que ele estava caminhando havia um restaurante movimentado. Ele tinha uma
construção sólida, mas ao mesmo tempo aconchegante, dando para o braço de mar
que podia ser visto das suas sacadas. Lá estavam seus amigos e ele, quase
chegando, se sentia feliz. Tinha uma sensação de posse, como se tudo aquilo lhe
pertencesse.
No outro, era um jovem
que estava num ambiente fechado com vários amigos, todos se preparando para sair. Observou que todos
vestiam grossos casacos para se protegerem do frio. Nisso, lhe ocorreu que ele
não tinha nenhuma roupa do tipo. Estava imaginando o que fazer, arrumar um
casaco emprestado, deixar de ir... Quando então, acordou, retornando ao seu eu
original.
Seria ele aquelas pessoas
que protagonizaram esses ‘sonhos’? Será que de fato cada pessoa tem
simultaneamente mais de uma existência. Seriam aquelas as suas existências
paralelas? Mas, racionalizou, que
bobagem... Ele tinha que se preocupar com a sua existência atual. Uma coisa, ou
uma vida, de cada vez.
Parte II
Robert lembrou de uma frase que ouvira tempos atrás relativa aos
primeiros passos de uma criança:
“Aprender a andar significa não olhar constantemente para apoios seguros. Aprender a andar significa, acima de tudo, começar a confiar nas próprias pernas.’
Essa fala o fez refletir, até chegar à conclusão de que se nada do que
ele esteve fazendo nos últimos tempos - que acreditava ser o correto – estava
funcionando agora. Então, independentemente da idade, para mudar a situação, deveria
fazer algo diferente, algo que não estivesse acostumado a fazer.
Imaginou empreender algum negócio, alguma atividade que pudesse
proporcionar, além da atividade, algum rendimento. Naturalmente, não deveria
implicar em investimentos significativos uma vez que não tinha recursos.
Lembrou-se que já há alguns anos imaginou criar um Site para registrar
seus pensamentos, imaginando que algum dia, se tudo desse certo seus filhos
iriam ler e passar a conhecê-lo melhor. E, talvez, futuramente, seus
pensamentos pudessem ajudá-los em alguma fase de suas vidas. Então foi apresentado a um jovem que dava
aulas de inclusão digital para pessoas da terceira idade. Durante um certo
período teve aulas com ele, e conseguiu montar seu site e muito mais.
Naquela época esse rapaz já tinha um site e outros meios de comunicação
digital voltados para essa idosos, onde apresentava matérias de interesse para
esse público – incentivando-os a frequentar o espaço, a se relacionarem com
outras pessoas, além de se manterem atualizados sobre o que estava acontecendo
no mundo, dando ênfase especial ao social e ao cultural. Naquela época a frequência de visitantes já
era significativa, bem elevada em relação aos congêneres.
Considerando que a evolução demográfica previa um crescimento cada vez
mais significativo dos idosos em relação aos jovens, muitos empreendedores
estavam desenvolvendo produtos e serviços para esse pessoal, seria muito
inteligente investir nesse segmento.
Oportunamente, em parceria com o jovem, atualizaram o site e os outros
meios de comunicação digital que utilizavam, e começaram a oferecer a
possibilidade de empresas ou pessoas que tinham produtos, serviços, ou eventos
voltados para esse público, a anunciarem através deles para divulgação da sua
marca ou do que tinham a oferecer.
O início foi fraco, mas em função do potencial que eles já tinham, os
resultados começaram a aparecer. A procura foi aumentando, aumentando, a um
ponto tal que tiveram que se organizar para não se perderem.
Inicialmente, eram procurados por quem tinha alguma coisa a anunciar,
publicar. Em seguida começaram a procurar clientes em segmentos importantes e a
oferecer seus serviços. A volume de
resposta foi tal que tiveram que se estruturar para poder continuar atendendo,
obter bons resultados. No finalmente,
tornaram-se profissionais, tornaram-se uma empresa.
Colocou em prática o conhecimento, a experiência, que acumulou durante a
sua vida empresarial:
- Coloque sua atenção no que você quer,
e abra caminhos para atingir sua meta.
- Envolva as pessoas em sua visão e
missão, para dividir e produzir mais
- Delegue, compartilhe e auxilie. Forme
e trabalhe em equipe
- Saiba ouvir, peça feedbacks, respeite
o que outro tem para falar
- Influencie o clima da área e dos
ambientes por onde passar, de forma positiva, deixe nos ambientes informações
boas.
- Valorize o que você faz e o que os
outros fazem bem.
- Comunique com clareza,
sensibilidade, e harmonia.
Decorrido algum tempo teve uma outra ideia. O mercado de trabalho era
voltado preferencialmente para jovens. Entretanto, entre aqueles com mais de
50, que já estavam fora do mercado e tinham pouca chance de recolocação, haviam
muitos profissionais competentes que ainda poderiam contribuir, trabalhar. A ideia foi criar uma agência de emprego para
esse povo, e oferecer seus serviços através de anúncios.
Considerando a
diversidade de serviços que poderiam oferecer, criaram a empresa ‘Vovô Conserta’.
Os serviços disponibilizados variavam, desde fazer reparos
residenciais gerais, carpintaria, limpeza, acompanhamento de idosos e doentes,
levar e buscar criança na escola, até dar assessoria financeira, administrativa
e organizacional, para novos empreendedores, pequenas empresas. Observando que os candidatos estavam, muitas
vezes desatualizados, montou uma ‘‘Escola
Profissional para Idosos’, em parceria com uma entidade pública voltada para o ensino proficionalizante, para atualização desse pessoal nos
diversos segmentos, e obtenção de uma padronização, qualidade do serviço
prestado.
Passados alguns anos, o
negócio anda quase que sozinho. Foram contratadas pessoas qualificadas para
atender cada área da atividade, tendo bem claro quais são os objetivos e a
prioridade. Hoje, a empresa é um sucesso.
Hoje, Robert se sente realizado,
feliz. Além do que ele já havia construído no passado, o que fez agora, depois de idoso, serviu para dar um novo sentido para a sua própria vida e, igualmente, para a de tanta gente.
“Sucesso não tem a ver com o dinheiro que você ganha. Tem a ver, principalmente, com a diferença que você faz na vida das pessoas.” Michele Obama
(JA, Abr17)