Já se passaram
muitos anos desde então. Mas, aquele garoto que eu fui ainda vive na minha
memória.
Ele era
confiante – talvez por influência da minha mãe que sempre procurava nos fazer
sentir melhor do que nós éramos de fato.
Embora tivesse
consciência de minhas limitações
decorrentes da idade, situação financeira, etc., não tinha dúvida
nenhuma de que, algum dia, iria conseguir superar tudo aquilo.
Conforme fui
crescendo, independentemente de onde estivesse, sempre soube porque estava ali,
e qual seria o próximo passo para chegar onde pretendia. E, sem falsa modéstia, frequentemente cheguei.
Eventualmente
encontro colegas com os quais compartilhei alguns momentos da minha vida, e
comentando sobre aquela época, percebo que nossa percepção do que vivemos então
é muito diferente.
Por exemplo, participei
de um grupo de amigos do antigo Colegial que se encontrava todos os sábados na
casa de um dos colegas, para jogar futebol de salão. A casa, para os meus
padrões da época, era uma mansão, que ficava num bairro chique, distante de
onde eu morava. O pai dele, participativo, passava a manhã nos vendo jogar,
sentado numa mesa onde era colocado um lanche saboroso para nós tomarmos depois
do jogo. Considerando o tipo de vida limitado em que eu vivia, aqueles momentos
eram muito importantes, muito mais do que eram para eles, como pude constatar.
Conversando especialmente com um deles – o filho do dono da casa -, que
reencontrei ocasionalmente num cartório –ambos estávamos ali assinando uma
escritura de compra de imóvel. Esse encontro foi significativo por si próprio,
considerando que ele era filho de um empresário bem sucedido, rico; e, agora,
passados alguns anos, estávamos numa situação de igualdade. Conversando com ele
sobre aquele tempo passado, percebi que o que foi tão importante para mim, para
ele era uma lembrança trivial, comum.
Numa outra
situação, trabalhava num banco americano, onde tive oportunidade de
conhecer uns caras que passei a admirar pelas pessoas que eram, e pelo que
faziam no trabalho – uma atividade que eu considerava fantástica: eles organizavam
a estrutura da empresa, e definiam o trabalho que cabia a cada setor e a sua interpelação. Pretendi
ser transferido para o departamento deles, mas não foi possível. Segundo o seu diretor, aquela função era destinada para pessoas com diploma
universitário, formados pelas melhores faculdades. Bem, eu tinha acabado de
entrar na faculdade e, naturalmente, não deu. Mas, na minha classe da faculdade, havia um colega que trabalhava nessa mesma área, numa outra empresa, a empresa ‘A.
Fiz que fiz, e ele, certamente por cansaço, conseguiu uma entrevista para mim. Acabei sendo
admitido para trabalhar na área. Aqueles anos trabalhando lá foram fundamentais
para minha futura carreira profissional. Após alguns anos, por conta da
experiência que havia adquirido, consegui ser admitido numa multinacional
alemã, fazendo aquilo que gostava de fazer. Muitos anos mais tarde, encontrei
um daqueles colegas da empresa ‘A’, e comentei com ele como foi interessante o
trabalho que fazíamos lá. Ele discordou totalmente; disse que foi a pior época
de sua vida profissional. Por que será?
Por que duas pessoas que viveram o mesmo momento, tiveram dele uma percepção
tão diferente?
A resposta a
essa pergunta só fui encontrar muito tempo depois. Senti o que senti porque,
estivesse onde estivesse, sempre tinha um motivo, um objetivo definido, a
alcançar em seguida. O lugar, as circunstâncias atuais, onde estava, faziam
parte desse plano e, independente do que
significavam para a maioria, do meu ponto de vista, eram válidos porque iriam
viabilizar a alcançar em seguida o que pretendia.
Assim,
concluí, tudo o que tivermos oportunidade de viver pode ser importante,
significativo, interessante, desde que tenha um propósito, faça parte de um plano
maior, que deverá nos levar a cumprir o nosso destino idealizado.
Dentro desse
contexto, olhando para trás, comparativamente ao meu presente, embora saiba que
ainda há caminhos a percorrer, a par de algumas dificuldades, de alguns
sucessos, de algumas frustrações - que sempre farão parte da nossa vida, continuo
me sentindo bem, e otimista. Sei o que pretendo, e tenho definido meu próximo
passo, objetivo. “O mundo ideal só existe na nossa imaginação, mas serve de referência para entender e suportar o nosso presente, e alcançar um futuro melhor.“
(JA, Fev18)