A epidemia acaba, mas a solidariedade permanece e pode transformar o Brasil
Fique em Casa!’, diz a frase pintada com uma representação do Coronavírus, no chão de uma praça em Munique-AL |
Esta geração de brasileiros começa a
atravessar um período de temor e privações, para o qual não foi preparada pela
vivência nem pelo treino. Milhões de famílias estarão progressivamente
confinadas em suas residências, nas próximas semanas.
A liberdade de ir e vir, de sair para
trabalhar ou estudar, de encontrar os amigos, e de viajar, será restringida
severamente.
Uma vasta parcela dos concidadãos
arcará com sacrifício duplo. Sua renda, pouca, depende da circulação de pessoas
e mercadorias, e desabará. As reservas, se é que existem, vão se esvair
depressa, e os programas tradicionais de auxílio governamental passam ao largo
de tais circunstâncias.
Outro contingente de compatriotas,
também desprotegido, expõe-se a risco elevado com a chegada da epidemia do novo
coronavírus. Idosos e indivíduos portadores de outras enfermidades sujeitam-se
a sofrimento prolongado nas emergências, e ao risco maior de morte se forem
infectados.
É para resguardar os mais vulneráveis
—seja da violência do patógeno, seja da depauperação— que toda a sociedade
agora deveria se mobilizar.
Mudar os hábitos, delegar poderes
limitada e temporariamente maiores às autoridades, entregar-se a jornadas
extenuantes e arriscadas como têm feito os profissionais da saúde e reduzir a
atividade produtiva resultará plenamente recompensador se, ao final dessa
dolorosa estrada, muitos brasileiros houverem sido poupados da morte e da
miséria.
Olhar para o outro que sofre e
estender a mão, é exercício que há de fazer bem à comunidade. Num país em que
iniquidades abismais convivem desde sempre com a indiferença —quando não
cumplicidade— das elites e dos governantes, um choque como esse poderá ter
consequências duradouras.
Que se elevem recursos e esforços
coletivos na emancipação de dezenas de milhões, hoje condenados à ignorância e
à baixa renda. Que cresça a intolerância a privilégios concedidos a poucos pelo
Estado.
Que se cobrem dos políticos
eficiência, respeito ao conhecimento científico, e responsabilidade com o
bem-estar, desta e das futuras gerações de brasileiros.
A epidemia acaba, mas a solidariedade
não irá embora, e poderá transformar o Brasil.
Fonte: Sérgio Dávila, Diretor de
Redação FSP
(JA, 22-Mar20)