Caroline Norton em 1863 | John & Charles Watkins /
National Portrait Gallery)
"Até que esta mulher não se se dedicasse à causa, as esposas
inglesas não tinham direitos para ver seus filhos ou mesmo se divorciarem.
‘Eu existo e
eu sofro; mas a lei nega minha existência’.
No papel, as
mulheres casadas não existiam. Elas eram fantasmas legais, incapazes de possuir
propriedades, processar seus maridos por divórcio, ou ganhar uma renda separada
que, tecnicamente, não pertencesse ao marido também. Era a Inglaterra do século
19, e até mulheres inteligentes e independentes como Caroline Norton eram
praticamente impotentes - especialmente contra os caprichos de um esposo
vingativo.
Felizmente,
Caroline teve um emprego e uma rede de contatos poderosa. E, na ocasião em
que ela soube que seu marido planejava apropriar-se de todos os seus
rendimentos, frutos de seu trabalho como escritora, ela prometeu não escrever
mais nada, exceto petições para melhorar os direitos legais das mulheres em
casamento e divórcio.
Ela nasceu
Caroline Sheridan em 1808, em uma família financeiramente decadente. Seu avô,
Richard Brinsley Sheridan, era um dramaturgo proeminente mas que, no entanto,
morreu sem dinheiro. Depois disso, sua família conseguiu viver mantendo o bom
nome, mas não muito mais. Caroline era uma das sete crianças que viviam apenas
sob o cuidado de sua mãe, pois seu pai havia morrido jovem. Como a segunda
filha mais velha, Caroline foi pressionada para se casar cedo, embora, como se comentasse
na época, a sua sagacidade e sarcasmo intimidassem os pretendentes.
Então, George
Norton propôs casamento, assegurando à mãe de Caroline que ele era rico e bem
conectado. A última afirmação era verdadeira, pois George era filho de um Lord. Mas, após se casarem, Caroline,
então com 19 anos, descobriu que seu marido se recusava a trabalhar, apesar de
ter uma licença para advogar, e que não havia recebido nenhum subsídio
familiar. Meses depois, ele começou a abusar de sua esposa.
A fim de
ganhar dinheiro para a família, que logo cresceu com o nascimento de um filho,
Caroline começou a escrever. O nome de Sheridan ainda era reconhecido no meio
literário, e ela logo se destacou, da poesia à prosa. Começou a solicitar ser
recebida por nomes poderosos na política, incluindo o Ministro do Interior,
Lord Melbourne, um velho amigo do avô.
Com a
permissão de seu marido, que esperava lucrar com suas conexões, logo o casal se
tornou um amigo dele. Oportunamente, Melbourne nomeou George para um cargo de
gabinete, e o casamento se estabilizou. O casal teve mais dois filhos. Mas,
quando ela estava grávida de um quarto, George agrediu Caroline, e de tal forma,
que ela abortou.
Caroline Norton by Sir George Hayter in 1832
Na primavera
de 1836, George sequestrou seus filhos e os escondeu da sua mãe. Legalmente,
como uma pessoa ‘inexistente’, Caroline não tinha o direito de vê-los se o
marido a proibisse. Então, dando um passo em direção a se divorciar de Caroline, e
mantê-la distante de seus filhos, George processou Melbourne por seduzir sua
esposa. Na ocasião, este último, era primeiro ministro da Inglaterra. As
acusações por si só causaram um grande escândalo, e embora tivessem sido julgadas
improcedentes pelo tribunal, tornou tudo mais difícil para Caroline. A opinião
popular a marcou como uma mulher ‘liberada’, e permaneceu casada com George.
Mas ela não
aceitaria isso. Agora, vivendo separada do seu marido, Caroline publicou um de
seus primeiros panfletos políticos, intitulado ‘Observações sobre a Reclamação
Natural de uma Mãe à Custódia de seus Filhos como afetada pelo Direito do
Direito Comum do Pai’, em 1837. Ela pressionou legisladores para considerar um
projeto de lei que permitisse que as mulheres se defender para manter a
custódia de seus filhos. Em 1839, o Parlamento aprovou a referida lei, mas
restringiu a custódia a menores de sete anos de idade. A mulher separada poderia conviver com seus
filhos mais novos, mas, entre sete e dezesseis anos, apenas ‘visitá-los’. Ainda
assim, ela estava progredindo.
Poucos anos
depois, ainda mantida à distância dos
filhos que moravam na Escócia, seu filho mais novo, William, contraiu tétano
depois de se ferir ao cair de um cavalo. George permitiu que Caroline o visse,
mas antes dela chegar à Escócia, William morreu. Depois, ele permitiu a ela visitasse
as crianças sobreviventes com maior frequência.
O interlúdio
pacífico foi breve. Quando Caroline ganhou mais dinheiro com sua escrita, e
recebido subsídios ocasionais da sua família, George tornou-se cobiçoso. Ele
propôs que Caroline aprovasse seu pedido de alocação dos seus rendimentos em um
de seus fundos fiduciários, com o compromisso de dar a ela um subsídio que permitisse
a ela se manter. Se concordasse, ele a deixaria em paz. E foi o que aconteceu. Mas,
ao longo de quatro anos, ele foi reduzindo o seu subsídio de forma
significativa, até ele cortá-la completamente em 1852. O acordo que ela assinou
não era legalmente exigível, uma vez que uma esposa ‘inexistente’ não podia
celebrar contratos vinculativos com seu marido.
Sozinha e
quase indigente, Caroline estava sem opções. Ela não podia entrar em acordos
legais sem o consentimento de seu marido, que ele havia negado. Nenhuma das
partes poderia se divorciar da outra; o adultério era o único motivo admissível
e apenas o marido tinha o direito de reivindicá-lo. Mas, o processo contra
Melbourne já havia expirado.
Além disso,
ele exigiu que ela revertesse a ele toda a renda de sua escrita, a qual,
legalmente como chefe de família, era sua propriedade. Foi quando Caroline passou
a escrever apenas sobre a reforma do divórcio. Em 1855, ela apresentou uma
carta ao Parlamento e publicou um pedido aberto à rainha Victoria que continha
detalhes de seu próprio casamento - um ato escandaloso em uma sociedade
educada. ‘Não considero isso como causa pessoal: embora seja uma causa da qual,
infelizmente para mim, eu seja apenas uma referência. É uma causa de todas as
mulheres... Se, no futuro, eu estiver pessoalmente preparada para enfrentar uma
situação desse tipo, este fato não alteraria a lei. A mesma injustiça pode
acontecer a qualquer tempo, para uma mulher que não possa lutar, nem ganhar,
nem escrever; a quem ninguém se disponha a ajudar’, escreveu ela.
Caroline Norton (à direita) sentada com o poeta Samuel
Rogers e Maria-Louisa Phipps, em uma pintura inacabada de Frank Stone, ~ 1845.
(National Portrait Gallery)
Curiosamente,
no entanto, Caroline não considerou que as mulheres sejam iguais aos homens. Em
sua carta à rainha, ela incluiu uma advertência: ‘A posição natural da mulher é
inferioridade ao homem. Amém! ... Nunca preguei a doutrina selvagem e ridícula
da igualdade’. A batalha pelo sufrágio, e outros direitos iguais para as
mulheres, não era dela.
O Parlamento
aprovou a ‘Lei de Causas Matrimoniais de 1857’, uma lei que foi um divisor de
águas, que permitiu que as mulheres se optassem por divórcio pela primeira vez -embora
o ônus da prova ainda fosse maior do que o dos homens-, para iniciar contratos
legais, e para manter a posse de seus próprios ganhos e heranças, assim como
uma mulher solteira faria.
Após suas
vitórias políticas, Caroline Norton tornou-se mais criativa e voltou a
escrever. Sua produção resultou em cinco novelas e cerca de uma dúzia de
volumes de poesia. Ela é considerada a inspiração por trás da heroína na novela
de George Meredith de 1885, ‘Diana of the Crossways’.
George Norton
morreu em 1875, como marido de Caroline. A partir de então, ela era livre e se casou
com o escritor e político Sir William Stirling-Maxwell, em março de 1877.
Morreu três meses depois, no dia 15 de junho."
Texto:
Stephanie Buck | Medium
Resumo
Principalmente
por causa da intensa campanha de Caroline, que incluiu uma carta à Rainha
Victoria, o Parlamento aprovou a ‘Lei de Custódia dos Bebês’, 1839; a 'Lei de 'Causas Matrimoniais’, 1857 e a ‘Lei
de Propriedade das Mulheres Casadas', 1870. Em sua biografia mais recente, Diane
Atkinson, observa que, ao contrário de 1839 e 1857, Caroline não participou da
campanha para a Lei de 1870.
Em 1849, o
pintor Daniel Maclise terminou seu afresco ‘Justiça’ para na Câmara dos Lordes,
para a qual Norton serviu de modelo. Ele a escolheu ela porque foi vista por
muitos como uma famosa vítima de injustiça.
(JA, Nov17)