Num casebre mal iluminado, um idoso,
dormitando, tentava escrever para seu filho João, que estava vivendo em São
Paulo.
A vela tremia quando o vento entrava pela
janela sem vidros. Já era tarde e o dia tinha sido duro para ele, embora tivesse
desde sempre trabalhado pesado na pesca de arrastão.
“ Meu bom filho, teja bem na graça de
Deus. Aqui a miséria campeia como mato bravo em roçado, e, além disso, te tenho
muito sodade. Porisso, quero muda prá aí, prá vive com ocê, com tudo de bom que
Sum Paulo deve ter...”
“Meu pai, não venha para cá. A cidade
é muito grande, tudo é bonito e diferente. Mas, essa beleza toda não modifica
muita coisa. Tenho tanto dinheiro no bolso como quando saí daí. Para se viver
aqui, tem que se gastar muito; então, não adianta ganhar mais.
Muitos anos se passaram, já tenho
mais idade, entretanto não sou bem feliz como imaginava que poderia ser quando
vim para cá; muito pelo contrário. Talvez seja porque estou longe dos meus amigos de sempre. De vez em quando, até penso
que as pessoas que me querem bem tenham ficado todas por aí. Hoje, por
exemplo, é Natal. Não sinto mais aquele gostinho de alegria que sentia nesse
dia, vendo o mar, os tocadores de viola, e a criançada brincando com as bolas
coloridas ou bonecas, que tinham ganhado do velho ‘Noel’.
Meu Noel sempre foi o senhor - aliás foi
só aqui que descobri isso -, e, então, passei a lhe gostar mais ainda. Pena que
tudo isso agora só exista na minha lembrança.
Vou voltar! Já decidi! É aí que é o
meu lugar. É verdade que vou deixar aqui muitas pessoas que tentaram me ajudar
a progredir, que me compreenderam.
Porém, não vou esquecê-las não; vou sempre lembrar delas com carinho e
gratidão. É que agora descobri, que onde
se nasce é onde se deve morrer. Parece
que tudo que plantamos durante a nossa vida, só dá frutos, tem sentido, quando
voltamos para o lugar de onde viemos, para as pessoas que mais amamos. Vou me
reencontrar ai. Então, vou me comparar
com quem eu era, e com quem eu sou agora. Vou tentar lembrar de tudo.
Uma vantagem vou levar. Quando saí
não pensava como hoje. Agora me sinto maduro, tranquilo. Compreendo mais as
coisas; não dou tanto valor ao dinheiro e carrego pouca ambição. Gosto das
coisas simples, prezo as pessoas, a humanidade inteira. E, basicamente, o que quero
mais é ser Feliz!“
“Uma das formas mais simples para se sentir feliz, é abandonar as coisas que te deixam triste.”
(JA, Mai15)