No último dia 27 de Julho, seria aniversário de Benito Mussolini, nascido em 1883. Não que devêssemos cantar parabéns, mas certas histórias merecem lembrança, pelo menos como alertas.
No início do século XX, o jovem
Benito militava no Partido Socialista e professava um ateísmo provocador. Ante
espectadores perplexos, desafiava Deus a provar sua existência fulminando-o com
um raio. Como sabemos, a sugestão não foi atendida, e, nesse caso, atrevo-me a
discordar dos desígnios do Altíssimo.
Prestigiado entre os
socialistas, Mussolini foi diretor do ‘Avanti!’, jornal partidário. Na Primeira
Guerra Mundial, porém, experimentaria uma reviravolta: contrário ao pacifismo
do Partido, desentendeu-se com a direção, e foi expulso. Lançou então um jornal
independente, ‘Il Popolo d’Italia’, preconizando a guerra. Não tardaria a
abraçar a extrema-direita, chefiando o movimento fascista.
Surgidos em 1919, os
fascistas cresceram rapidamente, impulsionados pela instabilidade social e
política da Itália pós-guerra. Também se valeram do ressentimento contra os
antigos aliados, que não teriam recompensado devidamente a participação
italiana na guerra.
Copiando a retórica aprendida
no socialismo, Mussolini atacava a exploração capitalista. Mas também
conclamava as pessoas a rejeitarem as esquerdas, bem como o falatório da
política parlamentar. Convocava os italianos de todas as classes a formarem uma
frente patriótica contra as ameaças externas, para restaurar no país as glórias
passadas; o mito de origem era a Roma imperial. Ele próprio, com liderança
magnética e oratória teatral, comandaria a jornada para esse futuro grandioso.
No começo da década de 1920, os
socialistas eram o principal partido político italiano. À direita, porém,
cresciam os fascistas, que aliás organizavam milícias para atacar fisicamente
os adversários. Entre esses dois polos, as demais forças políticas estavam
divididas, incapazes de acordo. Havia liberais que, não querendo seus rivais no
poder, preferiam que Mussolini o assumisse ‘transitoriamente’. A ‘transição’
iria durar mais de vinte anos.
Na polarização, muitos
enxergavam no fascismo a opção para evitar o socialismo, além de preservar a
monarquia, as tradições e os valores cristãos. Nessa ocasião, Mussolini já
engavetara as antigas falas anticlericais, e procurava atrair simpatias dos
conservadores. Anos depois, comentaria que, para acumular poder, é preciso
fazer como quem, pouco a pouco, depena uma galinha: escutando-se apenas um cacarejo
por vez, o processo corre o mais discreto possível. Que ninguém se queixe de
falta de aviso...
Em 1922, Mussolini conseguiu que o rei o nomeasse Primeiro-Ministro. Com sucessivas manobras, não tardaria a assumir poderes ditatoriais. Diferentemente, porém, da direita tradicional, o fascismo trazia, como novidade, a mobilização das massas em apoio ao ‘Duce’.
Eleito Papa naquele mesmo ano, Pio XI se alegraria de ver o governo italiano tomando várias medidas para cultivar boas relações com a Igreja Católica. Chegaria a chamar Mussolini de ‘homem enviado pela Providência’. Foi em 1929, quando a Itália firmou com a Santa Sé o Tratado de Latrão, resolvendo uma questão pendente havia décadas.
O país adotou o catolicismo como religião oficial’ e indenizou largamente a Igreja pelos territórios perdidos em 1870. Criou-se também o Estado do Vaticano, curioso país de 49 hectares (bem menos que o Parque do Flamengo ou o Ibirapuera).
Pio XI acabaria se
desiludindo do fascismo italiano, sobretudo quando este se aproximou da
Alemanha nazista, assimilando características suas: exacerbação do nacionalismo
e do endeusamento do líder, belicismo,
racismo, perseguições aos judeus. Em 1939, quando morreu, já se tornara cada vez mais crítico
do regime, mas a Cúria Romana, controlada por cardeais simpáticos ao fascismo,
impediu que sua posição viesse a público.
Em junho de 1940, Mussolini
anunciou que também a Itália declarava guerra contra ‘as democracias
plutocráticas e reacionárias do Ocidente’. Nos combates, morreriam 400 mil
italianos, a maioria em terras soviéticas.
No final de abril de 1945, quando a
derrota era iminente, guerrilheiros antifascistas barraram, perto do Lago de
Como, o comboio alemão em que Mussolini, disfarçado, fugia para os Alpes.
Prenderam-no e acabaram por fuzilá-lo. Exposto numa praça de Milão, seu corpo
seria pisoteado por uma multidão em fúria e, posteriormente, dependurado de
cabeça para baixo. A popularidade de antes já se desvanecera, e nem mesmo
adiantaram as vitórias em duas Copas do Mundo.
Mas o fascismo, tal como
certos vírus, volta e meia reaparece, e ainda hoje há quem aceite flertar com
ele. E até quem se ponha a listar pessoas com o suposto defeito de serem
antifascistas.
Fonte: A.C. Boa Nova | AMDG
(JA, Ago20)