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80 anos do assassinato de Trotsky, as ideias do arauto da revolução

 Obra do líder do soviete de Petrogrado soçobrou no funesto maremoto onde se atropelam o passado e a derrota

 

No próximo dia 21, será o 80º aniversário do assassinato de Leon Trotsky, o líder do soviete de Petrogrado na Revolução Russa. Depois, ele dirigiu o Exército Vermelho, venceu a guerra civil, e consolidou a União Soviética, que criou um partido mundial da revolução, a Internacional.

Aí foi caçado como um cão pelos seus ex-companheiros e novos inimigos. Vagou pelo mundo sem ter pouso, até ser morto, no México, pela picaretada de um agente de Stálin - o ditador do Estado sem patrões, nem propriedade, nem democracia, do qual ele, Trotsky, foi essencial na criação.

Sua obra soçobrou no funesto maremoto, onde se atropelam o passado e a derrota. A União Soviética naufragou. O comunismo foi a pique. O marxismo mal se mantém à tona em botes esburacados. Trotsky morreu para sempre?

Talvez continue mortinho da silva, até que a revolução deixe de ser uma ideia anacrônica, e vire de novo algo palpável. Agitações, motins e até insurreições ocorrem hoje com sofreguidão frenética: gilets jaunes, Chile, Argélia, Hong Kong, Estados Unidos, Líbano, Belarus.

São revoltas contra aquilo que ele também lutou: a exploração, a desigualdade, a opressão, o racismo, a casta política podre. Mas não são revoluções. Estas se definem pela derrubada, violenta e popular, de uma ordem social, e sua troca por um novo sistema político e econômico.

Trotsky participou de duas revoluções. Elas lhe definiram a vida, e renderam seus melhores livros. Em 1905, ele era o que o Brasil bem pensante chama de extremista. Tinha 26 anos, e estava fora de partidos quando começou o quebra-quebra.

Viu o movimento de trabalhadores que, para pasmo da esquerda, criou espontaneamente os sovietes - os conselhos populares eleitos diretamente. Com a derrota da revolução, foi banido para a Sibéria. Entretanto, fugiu durante a viagem, e se exilou.

Publicou ‘Balanço e Perspectivas’, uma síntese da revolução, com uma ideia formidável, a do desenvolvimento desigual e combinado. O capitalismo é um sistema mundial, disse, mas contraditório e assimétrico. O progresso se alimenta do atraso e vice-versa.

A escravidão, ou a servidão, ou a condição colonial, são momentos presentes da sociedade do capital. Os países periféricos não são quistos do passado, nem estão fadados a seguir etapas retilíneas no rumo do progresso. Poderiam passar direto do arco e flecha para a dinamite.

Trotsky concluiu da tese que as conquistas das revoluções burguesas - igualdade perante a lei, república, reforma agrária, independência nacional, industrialização - só poderiam ser obtidas pelos trabalhadores, e apenas no quadro da construção do socialismo: a revolução permanente.

Veio 1917 e ele voltou para a Rússia, e liderou a tomada do poder. A experiência lhe valeu sua opus magnum, ‘História da Revolução Russa’. O livro não tem equivalente. Seria como se Robespierre narrasse o 1789-1794 francês.

É um afresco de 1200 páginas que circula entre o geral e o particular. Expõe o período, mas flagra um cossaco a cavalo piscando para um operário rebelde. Usa economia, história, sociologia e jornalismo, para captar a coletividade trabalhadora em movimento.

Seu mote é o de Spinoza: não rir, nem chorar, mas compreender. Nesse espírito, aceita e até elogia pontos de vista dos conservadores. Seus parágrafos comportam perspectivas antagônicas, e buscam uma síntese que as supere.

Assim, diz com ironia que, na derrubada do czar, os liberais eram convincentes, ‘mas como é lamentável que o liberalismo, que conhecia tantos remédios infalíveis para salvar a monarquia, não tenha encontrado meios de salvar a si mesmo’.

Afirma que é enganoso comparar figuras históricas —e logo esmiúça a personalidade de Luis 16 e de Maria Antonieta, contrastando-as com as de Nicolau 2º e da czarina Alexandra. Diz que a revolução foi feita pelas massas, mas demonstra que sem Lênin ela não venceria.

‘História da Revolução Russa’ foi escrito num novo exílio, depois de Trotsky ter perdido o poder. Era o início de uma série de derrotas políticas, cujos motivos se reduzem a um só: a revolução permanente não vingou na Rússia, nem em lugar algum.

Já o desenvolvimento desigual e combinado, ainda descreve a marcha destruidora do capitalismo triunfante. Só que agora, numa situação mais complexa. A velha concentração da riqueza convive com hecatombes ambientais, vagas de migrantes, reclamos identitários, crises da democracia, armas nucleares.

É uma crise permanente. Revoluções, se e quando vierem, serão bem diferentes das que Trotsky viveu.

 


Fonte: Mario Sergio Conti  |   FSP

 

(JA, Ago20)

 


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