Eles se conheceram durante um
curso de especialização profissional. Naqueles poucos dias, se aproximaram,
descobriram afinidades, começaram a se falar, a se encontrar fora do ambiente
do curso, e se apaixonaram.
O sentimento que cada um tinha pelo
outro era algo muito diferente de tudo que já haviam sentido até então, em
termos de qualidade e de intensidade. Ambos não eram mais tão jovens. Tinham em
torno de 35 anos, haviam sido casados, tinham filhos, enfim cada um tinha uma
história de vida quase completa.
Inicialmente, a paixão deles era tão
intensa que não conseguiam deixar de um pensar no outro, estivessem onde
estivessem. Imaginavam como seria se o
outro estivesse ali ao seu lado, qual seria sua reação, o que diria, o seu
olhar, o seu sorriso... Eles se completavam, supriam as carências e
potencializavam as qualidades, talentos, um do outro.
Seus programas eram quase iguais aos da maioria
dos namorados. Por exemplo:
“Eles ainda estavam bem no início do
namoro. Ela foi passar o fim de semana na casa de uns amigos numa cidade
litorânea próxima. Ele pensou em visitá-la, conversaram, e ela concordou.
Pela manhã encontrou o grupo na praia. Ela o apresentou para seus
amigos dizendo: ‘- Este é o meu homem!’ Meio inusitado e, mesmo sendo
explicável pela falta de completo domínio do idioma português e
dos costumes coloquiais do país, por parte dela. Ess fala o surpreendeu, o deixou super orgulhoso.
Afinal, quem havia dito isso era uma mulher extremamente bonita e articulada.
Ficou registrado.”
"Num sábado pela manhã, ele a convidou
para fazer um passeio. Encontraram-se, e sem qualquer planejamento prévio, ou
portando roupas adequadas, pegaram a estrada e seguiram rumo ao litoral. Cerca
de uma hora e meia depois, chegaram a uma pequena cidade, e se
instalaram num hotelzinho ‘pé na areia’. Tomaram um lanche, andaram pela praia com as calças arregaçadas para não molhar. Mais tarde, almoçaram frutos do mar - típicos da
região, e descansaram. À
noitinha, voltaram. Foi um dia lindo e marcante na vida deles: pelo inusitado e
pelos momentos prazerosos que puderam desfrutar juntos.”
Viveram em casas separadas por quase um ano e, no final desse primeiro ano
passaram a viver juntos. Ele se instalou no apartamento dela, enquanto
providenciava um outro, mais adequado.
Foi então, que num determinado dia, Alex descobriu que Berthe não havia lhe contado todas as coisas
importantes da sua vida passada. Aquilo o surpreendeu, magoou. Primeiro porque,
inicialmente, ele lhe havia pedido que ela lhe contasse tudo do que julgasse
importante ele saber. E, em segundo, porque o que ele ficou sabendo, tinha a ver
com um relacionamento anterior dela. Isso não teria pesado tanto, não fosse o fato da
pessoa envolvida ser alguém com a qual ele se relacionava até então, social e
profissionalmente. O fato de o seu conhecido saber mais do que ele, num assunto
tão pessoal, íntimo, o incomodou muito.
Refletindo, chegou à conclusão que
aquilo havia acontecido, seria possível acontecer outras vezes, pois, embora ela tivesse se desculpado, não havia dado tanta importância ao
assunto quanto ele - talvez por uma questão cultural, costumes diferentes, sabe-se
lá. E, pensando assim, conhecendo-se como se conhecia, concluiu que a vida em
comum com ela seria inviável. Perdera a confiança e, daí para frente, sempre teria
dúvida quanto ao seu comportamento, à sua sinceridade. Resolveu abortar o
projeto de uma nova residência comum.
Mais tarde, conversaram sobre, e
concluíram que, diante de como ele se sentia, principalmente, a separação seria
a melhor opção. Ela, que há anos estava
postergando o retorno ao seu país de origem, resolveu que agora seria o momento
ideal.
No dia da partida dela, ele foi
levá-la ao Aeroporto. Despediram-se e, no portão de embarque, ela o fez prometer
que não iria esquecê-la, que iria manter contato,... Pediu que, quando ele
fosse embora, não olhasse para trás, para ela. E foi o que ele fez.
Alex voltou para o apartamento que
habitavam, que ele havia ficado de devolver para o locatário, e reparou que ela
havia deixado algumas peças de roupa jogadas ao lado da cama. Ele as pegou na
mão, e sentiu aquele seu perfume caraterístico, especial. Despediu-se das
roupas da mesma forma como se despediu dela, e partiu. Partiu para sua nova
vida.
Não se sentia revoltado; sentia-se
lesado por tido que abrir mão de algo que considerava tão precioso. Ela lhe
faria muita falta. Embora tivesse consciência que havia feito o que deveria,
não se sentia tranquilo.
Decidiu que, a partir de então,
revisitaria todos os lugares em que esteve com ela enquanto estiveram juntos:
restaurantes, bares, hotéis, viagens, amigos comuns, ... Fez uma programação e
foi a esses lugares e, em cada um, sentiu fortemente a presença dela.
Relembrava os momentos em que estiveram ali, e, ao final, se despedia, como se colocasse aqueles momentos passados numa caixa de recordações. Fez isso durante meses. Foi trabalhoso, penoso, mas serviu como que para exorcizá-la da
sua vida, libertá-lo.
A partir daí, mais tranquilo, seguiu
reconstruindo sua vida.
Ocasionalmente se falaram por telefone,
ou através de mensagens escritas. Nesses
contatos ficava evidente a falta que um fazia para o outro, uma saudade comum,
uma tristeza assumida parte a parte.
Com o passar do tempo esses contatos
foram rareando, até cessarem completamente.
Hoje, passados tantos anos, eles,
embora ausentes, distantes, ainda se sentem unidos. Eventualmente ainda se
reencontram mentalmente, independentemente do tempo e do espaço.
(JA, Out15)