Pular para o conteúdo principal

O conforto supremo é a verdade



Jacques Lacan, psicanalista, 1901-1981

Anos 1970, em Paris. Perto do consultório do psicanalista Jacques Lacan, havia um café onde pacientes e supervisionandos costumavam se encontrar antes ou depois das sessões.

Numa tarde do inverno de 1975 ou 1976, uma amiga querida, tensa e transtornada, entrou e veio se sentar ao meu lado, em silêncio. De repente, ela levantou e disse: ‘Volto para lá’. Obviamente, ela tinha saído de uma sessão de análise perturbadora, e precisava voltar, pedir ou procurar mais uma palavra.

Esperei; queria rever minha amiga quando ela voltasse. E ela voltou aliviada, rindo sozinha, sacudindo a cabeça como para se mostrar descrente no que acontecera.

Ela se sentou e me disse: Tive uma sessão sobre os desejos mais duvidosos que pairavam sobre meu berço; descobri que sou filha de uma farsa sinistra. Bom, saí da sessão péssima. Voltei para dizer a Lacan: ‘com a história que lhe contei, fico com a impressão de que estou fodida’.

Aqui ela me olhou um momento, sorrindo atrás da xícara de café, e concluiu me relatando a réplica de Lacan: ‘Mas, minha querida’, Lacan lhe disse, ‘não é apenas uma impressão: com a história que é a sua, você está mesmo fodida’.
Rimos ao constatar que o conforto supremo é a verdade, sempre.

Aparte: muitos acham que Lacan é um autor de leitura difícil. Pode ser, mas ele era um clínico genial —sem isso nunca teria conseguido praticar com sessões breves ou brevíssimas e nunca teria sido o mais extraordinário entrevistador de pacientes psicóticos que me foi dado escutar.

Aquela tarde dos anos 1970 voltou à minha memória quando, na quarta retrasada, numa conversa da série ‘Dilemas Éticos’, chamada ‘Coronavírus, entre a Apatia e o Desespero’, o rabino Michel Schlesinger me perguntou o que eu espero, na crise que vivemos, dos líderes religiosos. Respondi que, tanto dos líderes religiosos como dos políticos, não espero nada menos do que aprendi e tento praticar como terapeuta e analista, a saber: é errado mentir para confortar ou consolar.



É errado moralmente —porque quem mente aposta na ideia de que, por causa do perigo, do sofrimento ou da incerteza, o outro seja diminuído ou infantilizado, a ponto de comprar qualquer esperança fajuta.

E é errado em vista do efeito desejado, porque o conforto eficiente, se ele for possível, é aquele que se constrói em cima da verdade.

Exemplo. A alguém que vai morrer amanhã, não precisamos nem podemos dizer que ele ou ela vai sarar hoje à noite, que viverá em outra vida, ou que os anjos ou as virgens do paraíso o esperam de braços abertos. É claro, é possível (e é uma necessidade antiga) acreditar num além, mas quem quer confortar não deve recorrer à ilusão, nem num momento extremo. Há mais conforto, por exemplo, num balanço em que se pergunta se a vida valeu a pena ou não, do que na ilusão de ganharmos mais tempo ou de uma vida após a morte.





Fonte: Contardo Calligaris, psicanalista, autor de 'Hello Brasil!' , 'Cartas a um Jovem Terapeuta', e 'Coisa de Menina?', com Maria Homem  |   FSP




(JA, Abr20)



Postagens mais visitadas deste blog

Grabovoi - O Poder dos Números

O Método Grabovoi  foi criado pelo cientista russo Grigori Grabovoi, após anos de estudos e pesquisas, sobre números e sua influência no nosso cérebro. Grigori descobriu que os números criam frequências que podem atuar em diversas áreas, desde sobrepeso até falta de concentração, tratamento para doenças, dedicação, e situações como perda de dinheiro. Os números atuam como uma ‘Código de desbloqueio’ dentro do nosso inconsciente, criando frequências vibratórias que atuam diretamente na área afetada e permitindo que o fluxo de informações flua livremente no nosso cérebro. Como funciona? As sequências são formadas por números que reúnem significados. As sequências podem ter  1, 7, 16, ou até 25 algarismos, e quanto mais números, mais específica é a ação da sequência. Os números devem ser lidos separadamente, por exemplo: 345682 Três, quatro, cinco, seis (sempre o número seis, não ‘meia’), oito, dois. Como praticar Você deve escolher uma das sequencias num

Thoth

Deus da lua, juiz dos mortos e deus do conhecimento e da escrita, Thoth (também Toth, ou Tot, cujo nome em egípcio é Djehuty) é um deus egípcio, representado com cabeça de íbis. É o deus do conhecimento, da sabedoria, da escrita, da música e da magia. Filho mais velho do deus do sol Rá, ou em alguns mitos nascido da cabeça de Set, era representado como um homem com a cabeça da ave íbis ou de um babuíno, seus animais sagrados.   Sendo o deus associado com o conhecimento secreto, Thoth ajudou no sepultamento de Osíris criando a primeira múmia. Era também o deus das palavras, da língua e posteriormente os gregos viam este deus egípcio como a fonte de toda a ciência, humana e divina, do Egito. O culto de Thoth situava-se na cidade de Khemenou, também referida pelos gregos como Hermópolis Magna, e agora conhecida pelo nome árabe Al Ashmunin. Inventor da escrita Segundo a tradição, transmitida também por Platão no diálogo Fedro, Thoth inventou a escrita egípc

O Homem do Saco, ou Papa Figo

Segundo a lenda, O Homem do Saco pega e carrega crianças que estejam sem nenhum adulto por perto, em frente às suas casas, ou brincando na rua. O sinistro Homem do Saco, também conhecido como ‘Papa Figo’, não tem poderes misteriosos ou místicos, muito menos habilidades sobrenaturais. Mas possui o atributo mais perigoso que pode existir - a mente humana. Originalmente Papa Figo possui uma aparência comum, ainda que bastante feia. É descrito como um homem velho e de jeito esquisito; é comum vê-lo sempre carregando um grande saco pendurado nas costas. Devido ao seu jeito costuma chamar a atenção das pessoas. Por conta disso, o velho Papa Figo prefere agir por meio de seus ajudantes para atrair suas inocentes vítimas, em geral crianças com idade abaixo dos 15 anos. Mas há relatos de jovens de 16 e 17 anos que tiveram seu sumiço associado ao Papa Figo. O Papa Figo seria um homem de bastante posses que, através de promessas de pagamentos em dinheiro, acaba at