Eles trabalhavam na mesma empresa.
Ela, Luisa, era uma jovem,
secretária-executiva, muito bonita e eficiente. Ele, Peter, um executivo de meia-idade, bem sucedido,
vindo da matriz, do exterior. Ela o achava interessante, mas não tinha nem como
se aproximar dele, tamanha a distância que os separavam: nível hierárquico,
cultura, relações...
Eventualmente, a empresa proporcionou um curso
de especialização para os funcionários no qual, por coincidência, tanto ela
como ele eram participantes. Então, tiveram oportunidade de se conhecerem
melhor, de se relacionarem socialmente. Ela, embora se sentisse atraída,
manteve posição, não abrindo espaço para uma maior aproximação. Ele entretanto,
sentindo-se atraído também, a procurou e criou oportunidades para se conhecerem
melhor, para se relacionarem fora do ambiente de trabalho. Ela, sentindo-se
lisonjeada, aceitou.
Peter era alguém que chamava atenção
pela sua boa aparência, modo correto de se vestir, posição, simpatia. Pouco a pouco foi conquistando o coração da
Luisa. Ela foi conhecendo seus amigos, e
ele também os dela. Convidado, foi à
casa dela onde conheceu sua filha de 6 anos. Ele, embora não tivesse filhos,
adorava crianças, e não teve dificuldade nenhuma em conquistar, ser aceito por
aquele serzinho.
Encontravam-se umas duas vezes por
semana, e nos fins de semana. Em uma
ocasião tiraram alguns dias de férias e foram para uma pousado litorânea. Ainda
sem cumprir os dias programados para ficarem na pousada, ela começou a sentir
fortes dores no abdômen. Resolveram voltar para levantar a causa dessas dores
com um especialista, e realizar o procedimento médico que fosse indicado. Ele a
acompanhou e ficou com ela durante cerca de uma semana – o tempo que ela teve que ficar internada no hospital.
Acabou não sendo nada grave, mas aquela foi uma prova de interesse genuíno que
acabou por conquistar o coração de Luisa.
Algum tempo depois, de comum acordo,
ela se mudou para o apartamento dele. Estava indo tudo bem, até que ela passou a perceber que, talvez por traços culturais de origem,
ele havia sido e era muito próximo de outras mulheres. Ela ficou indignada por
ele não ter dito nada a ela dos relacionamentos anteriores, principalmente porque,
algumas daqueles mulheres do passado dele eram suas conhecidas. Peter,
racionalizou dizendo que não havia dito nada por falta de oportunidade, mesmo
porque, eram relações vencidas. Quanto aos contatos mais recentes, considerava natural, tanto que contava para
ela – fomos almoçar juntos; no passado namorei
fulana de tal que por coincidência encontrei ontem a noite;... Isso era
de tal forma contra a sua natureza que, por mais que quisesse entender, não
conseguia, não aceitava.
A coisa continuou até que ela acabou
por concluir que não poderia jogar todas as suas fichas nesse relacionamento,
para não se decepcionar muito mais, lá na frente. Colocou a situação para ele que entendeu seus
motivos, e resolveram que o melhor nesse caso, era que cada um seguisse o seu
caminho. Oportunamente ele recebeu uma oferta para voltar para a matriz no
exterior e, por conta da situação, aceitou.
Ela o acompanhou até o aeroporto e ele lhe disse que gostaria de sempre
manter contato, insistiu com ela para ir visitá-lo... Na hora da partida, por alguma crença pessoal, pediu que ela não ficasse olhando para ele enquanto estivesse caminhando na direção ao portão de embarque do seu avião.
Naquele dia Luisa voltou para o
apartamento; viu algumas roupas deixadas por ele, e nelas sentiu o seu cheiro
característico. Ele nem tinha ido embora e ela já estava com saudade... Reiniciou
a sua vida, Recebeu algumas cartas dele, escreveu outras – ambos jurando amor
eterno... Na tentativa de minimizar a
dor da perda, ela, dentro das possibilidades, foi a todos os lugares
significativos onde tinham estado juntos. Reviveu aqueles momentos, passo a
passo - os olhares, pensamentos, as falas, fotos...-, voltando no tempo. Nessas ocasiões, se sentia estranhamente
feliz, como se tivesse reencontrado o seu amor.
O tempo foi passando, as cartas se
espaçando, até que pararam de vez. E ela
seguiu sua vida - novo emprego, novo relacionamento,.., como ele também deve ter seguido a sua.
Porém, aquele sentimento do passado
persiste ainda, independentemente da sua vontade. A lembrança do que passou e do que poderia
ter sido, permanece, como uma brasa latente, resultado de uma grande
fogueira cujas chamas, eventual e momentaneamente, se apagaram. Basta ver
alguém parecido, alguém como ele era naquela
época, que ela ainda vai conferir se seria ele mesmo. Claro que não é; mesmo porque o tempo passou para ele também.
O interessante é que Luisa tem a percepção de que Peter deve sentir o mesmo
que ela, até hoje.
É..., a vida tem algumas regras que não conseguimos alterar. Aparentemente, deve estar definido que devamos passar por algumas experiências e situações. E, nesse caso, por mais que tentemos evitar, por melhores que
sejam as nossas intenções e ações, acabam por acontecer. Por outro lado, Luisa
não se arrepende de nada do aconteceu: ganhou experiência,
viveu momentos que deixaram alegria, e colecionou lembranças maravilhosas, que
permanecem até hoje compondo positivamente o seu universo pessoal.
E, assim, eles ainda permanecem, tão
longe, mas tão perto...
(JA, Dez14)