Imperador D. Pedro 2º, em Lisboa, ~1876 |
Às 3h do dia 17 de novembro
de 1889, um domingo, d. Pedro 2º e a família imperial deixaram o Rio de Janeiro de
forma discreta, sem muitas testemunhas.
A República, proclamada em um
golpe no dia 15, havia determinado o exílio imediato dos Braganças,
comunicado a eles por oficiais subalternos.
Família Imperial reunida na escadaria do palácio Isabel, Petrópolis-RJ, 1889 |
O último imperador achou que
teria tempo de acompanhar a missa dominical das 11h na igreja do Carmo, mas o
medo de reações populares antecipou o plano do governo.
O isolamento da família
imperial não era novo, vide a perda de apoio de setores importantes como a
elite cafeicultora, a Igreja e o Exército.
‘A monarquia demorou muito
para abolir a escravidão e quando o fez já era tarde demais. Essa demora —nunca
se faz a história do se— custou muito a Pedro 2º’, diz a historiadora Lilia
Schwarz, autora de ‘As Barbas do Imperador’.
Princesa Isabel, RJ, ~1870
Embora a assinatura da Lei Áurea, que aboliu a escravatura em 1888, tenha conquistado popularidade para a Coroa, especialmente à princesa Isabel, o espírito do tempo, em um continente de repúblicas e presidentes, falou mais alto.
A decisão do exílio, apesar
de garantir que não houvesse reação contra a República, também deu a ela um
fantasma. O imperador foi embora, mas nunca abdicou oficialmente do trono.
A decisão de Pedro 2º de não
aceitar as compensações e pensões que a República oferecia, a morte da
imperatriz Teresa Cristina 21 dias depois do desembarque em Portugal, e a sua
própria morte, dois anos depois, em um quarto de hotel em Paris, ajudariam a
compor o mito do imperador mártir e injustiçado.
O funeral dele, em 1891, foi de
chefe de Estado. Duas bandeiras do Império cobriam o corpo e havia um pacote de
terra do Brasil que ele pedira que fosse posto em seu caixão. A imprensa
europeia falava do imperador ‘culto, gentil e indulgente’. Era a máxima do ‘rei
morto, viva o rei’.
Princesa Isabel e conde d'Eu no exílio, Castelo d'Eu, França, 1919 |
Embora a figura dele fosse a
referência do Império, Isabel seguiu em cena. Segundo o historiador e
pesquisador da USP Carlos Rogerio Lima Júnior, a última princesa
imperial mantinha correspondência com monarquistas que ficaram no Brasil.
Tirava fotos e as transformava em postais que enviava ao país.
Apesar disso, rejeitou a
proposta de mandar o filho mais velho, Pedro, para tentar a restauração em um
momento de revoltas civis no Brasil, por volta de 1893.
No exílio, os Orleans e
Bragança conviviam com nobres a quem eram ligados por sangue e casamento. A
família era mantida graças a uma pensão recebida pelo conde D’Eu —ele era filho
do duque de Némours, e neto do rei Louis Philippe 1º da França.
Em 1905, Gastão, o
conde, comprou de um primo o Castelo D’Eu, construído no século 16 na cidade de
mesmo nome na região da Normandia, norte da França.
Lá, a família instalou
quadros, peças, documentos e a biblioteca que levou do Brasil. Alguns dos
objetos, como quadros e cerâmicas indígenas, seguem no Museu Louis-Philippe,
aberto no local em 1973.
Em 1908, Pedro,
filho de Isabel, resolveu renunciar ao trono que já não tinha para se casar com
Elisabeth Dobrzensky de Dobrzenicz, filha de conde sem título nobre, e Isabel
comunicou ao sobrinho em Portugal, d. Manuel 2º, que a sucessão ao trono
brasileiro ficaria com o segundo filho, Luís.
Um ano antes, Luís tentou
voltar ao Brasil —sem sucesso, pois em 1907
ainda vigorava o banimento à família. Em
cartas, ele questionou a decisão do governo que não o deixou desembarcar do
navio, já que era seu irmão o sucessor, e não ele. Falou também como isso
demonstrava que a república ainda os temia.
‘O que chama atenção é o
esforço dele. Veio ao Brasil, escreveu um livro chamado ‘Sob o Cruzeiro do
Sul’, tentou ser membro da Academia Brasileira de Letras, se aproximou de
figuras como Euclydes da Cunha. Não é uma figura insana, um rei que sonha’,
afirma Lima Júnior.
Conde d'Eu com uniforme da Cruz Vermelha, Castelo d'Eu, norte França, ~1918 |
A Primeira Guerra Mundial, 1914-1918, mudou
a história. Em 1918, Antônio, o mais novo dos três filhos da princesa
Isabel, que lutou pelo Exército britânico, morreu em um acidente aéreo. Dois
anos depois foi a vez do herdeiro Luís, vítima de complicações de uma doença
adquirida na guerra.
Naquele mesmo ano, 1920, o
presidente Epitácio Pessoa revogou o banimento à família imperial. No ano
seguinte, o conde d’Eu e Pedro voltaram ao Brasil com os corpos de d. Pedro 2º e Teresa
Cristina para serem enterrados no país, antes das comemorações do centenário da
Independência. Meses depois, morreu na França a princesa Isabel.
‘O exílio da nossa família é
o maior exílio político da história brasileira. Não teve [Luís Carlos] Prestes,
[Miguel] Arraes, [Fernando] Gabeira, [Leonel] Brizola, ninguém teve exílio de 31 anos e por
lei. Era o medo da popularidade de d. Pedro 2º no Brasil’, diz João Henrique de Orleans e Bragança,
o d. Joãozinho, trineto do último imperador.
Uma parte dos descendentes de
Isabel voltou ao país. Tanto d. João, neto de Pedro, como o primo dele, d.
Bertrand, do ramo da família que descende de d. Luís e se coloca como titular
da Casa Imperial, respondem que a decisão de seus pais nascidos fora do Brasil,
de voltar, foi baseada no senso de dever com o país.
Chateau d'Eu |
O Castelo D’Eu ficaria com a
família até os anos 1950, quando foi comprado pelo empresário Assis
Chateaubriand. Chatô planejava instalar no local a Fundação Dom Pedro 2º, que
ofereceria bolsas a brasileiros que escrevessem teses sobre história do Brasil.
Não vingou, e o magnata vendeu o castelo para a cidade francesa.
Passados 130 anos da
expulsão, d. Pedro 2º está hoje no mausoléu em Petrópolis (RJ), inaugurado
por Getúlio Vargas em 1939. Na mesma cidade, parte de seus trinetos recebe o
laudêmio —2,5% do valor da venda de imóveis na região central do
município— como compensação pelas terras nunca compradas da família.
Paço Imperial |
Dentro desse
prédio ocorreram muitos acontecimentos marcantes para a história do Brasil. Foi
lá que D. Pedro I decidiu ficar no brasil e não voltar a Portugal – Dia do
Fico. Lá também a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea. Pesquisas dizem que o
paço foi o primeiro local da América Latina a ser fotografado, 1840.
Fonte: Fernanda Canofre |
FSP
(JA, Nov19)