A história do primeiro imperador
não termina ao deixar o Brasil. Em Portugal, ele venceria uma guerra civil
contra seu irmão tirânico.
Sabe por que
a colônia de Portugal é hoje um país só, enquanto o lado espanhol virou
Argentina, Paraguai, Chile, Peru, Equador etc.? Em grande parte, é por causa de
um cara mulherengo e temperamental que, aos 23 anos de idade, proclamou a
independência no meio de uma crise de diarreia. Durante muitos e muitos anos,
essa foi a imagem que nós fizemos do primeiro imperador, o homem que garantiu
que o Brasil virasse este país de 8,5 milhões de quilômetros quadrados. Dom
Pedro I só reinou por dez anos, mas foi o suficiente para segurar nossos
territórios – com exceção da Cisplatina que, em 1824, se tornou o Uruguai.
Depois, Pedro voltou a Portugal, onde se tornou um dos estadistas mais avançados da
Europa.
Nascido em
1798 no Palácio de Queluz, a casa oficial da família real portuguesa, em
Lisboa, ele tinha um nome longo e pomposo: Pedro de Alcântara Francisco Antônio
João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano
Serafim de Bragança e Bourbon. Chegou ao Brasil em 1808, quando seu pai, pressionado
pelos aliados ingleses e pelo exército da França, fugiu correndo de Portugal e
mudou a capital do reino para o Rio de Janeiro. Dom João encheu Pedrinho de
professores, mas o que ele gostava mesmo é de fazer farra na rua com os outros
garotos cariocas. Sua maior diversão era dar soco no queixo dos meninos que
vinham beijar sua mão. Adorava andar a cavalo, era bom marceneiro e ferreiro, e
passava horas conversando com os criados. Pedro era uma das poucas pessoas
bonitas da família, e tinha um charme que fez dele, aos 18 anos, um dos maiores
conquistadores do Rio de Janeiro.
A partir de
1815, quando Napoleão foi derrotado, a população de Portugal insistia na volta
de dom João VI para Lisboa. Ele enrolou o quanto deu, até que, em 1820, uma
revolução na cidade do Porto o obrigou a tomar uma atitude. Ele voltou, mas
deixou o filho. Chegando lá, virou uma figura decorativa. Quem mandava mesmo
eram os deputados portugueses, e eles queriam tirar poder dos brasileiros. Dom
João tentou obrigar Pedro a voltar, mas, depois de pensar muito, ele
desobedeceu.
As mulheres do imperador
Para tentar
fazer o jovem sossegar, arranjaram uma noiva para ele, a princesa Leopoldina
Carolina. Ela era o contrário dele: quieta, refinada, culta, com formação
científica e amizade com o compositor austríaco Franz Schubert, e com o poeta
alemão Johann W. Goethe. Certa vez, Leopoldina contou numa carta como foi o
primeiro jantar do casal: ‘Conduziu-me ao salão de jantar, puxou a cadeira e,
enquanto comíamos, piscou-me o olho e enlaçou a perna dele na minha embaixo da
mesa’.
Em seus 36
anos de vida, nosso primeiro imperador levou para a cama uma quantidade absurda
de mulheres. Ninguém sabe exatamente quantas – provavelmente nem ele sabia. O
certo é que ele tinha 18 filhos registrados, tidos com duas esposas e cinco
amantes. Nem família ele respeitava: além de sair com a dançarina Noemi
Thierry, também namorou a irmã dela. Até a irmã de sua amante mais famosa, a marquesa de Santos, caiu
nas graças de dom Pedro I. Mas a marquesa é que entrou para a história como a
maior amante do imperador. Seu nome, na verdade, era Domitila de Castro, e ela
não tinha nobreza, nem dinheiro, nem beleza. Mesmo assim, era a favorita. O rei
chegou ao cúmulo de obrigar sua primeira mulher, a imperatriz Leopoldina, a
aceitar a marquesa de Santos como dama-de-honra. Os dois amantes só brigavam de
vez quando. Quatro anos depois da morte de Leopoldina, em 1826, Pedro se casou
com Amélia, uma linda princesa alemã, de 17 anos.
Laços fora, soldados!
Na tarde de
7 de setembro de 1822, ao voltar de uma viagem a São Paulo, ele foi alcançado
pelo serviço de correio. As cartas contavam que os deputados portugueses
exigiam que ele demitisse seus ministros brasileiros.
De acordo
com um dos membros da corte, o padre Belchior, dom Pedro já estava irritado
porque estava com disenteria, e tinha que descer do cavalo o tempo todo. Ao ler
a correspondência, pisoteou as cartas, arrancou do chapéu o laço com as cores
portuguesas e teria dito as palavras famosas:
‘Laços
fora, soldados! Viva a independência, a liberdade e a separação do Brasil!’.
Em 12 de
outubro ele foi oficializado como nosso primeiro imperador.
Os problemas
só estavam começando. Além de ter que lutar contra os portugueses que se
rebelaram contra o novo imperador, dom Pedro I sentia que os novos deputados
brasileiros estavam desconfiados dele, e queriam aprovar uma Constituição que
tirasse seus poderes. Foi aí que a fama do soberano começou a ficar ruim: ele
fechou a Assembleia, convocou juristas amigos para escrever uma Constituição do
seu jeito, e obrigou todo mundo a aceitá-la. A revolta foi tão grande que quase
ninguém percebeu que aquela era uma das legislações mais avançadas do mundo.
Ela garantia, por exemplo, a liberdade de cada um expressar a própria crença
religiosa, coisa rara na época.
Impopular,
maltratado pela imprensa, e enfrentando várias revoltas simultâneas sem ainda
nem ter um exército, dom Pedro I ainda chocou os brasileiros com sua grande
quantidade de amantes. Quando seu pai morreu, em 1826, ele começou a ter dor de
cabeça também em Portugal. Tentou ser, ao mesmo tempo, dom Pedro I aqui e dom
Pedro IV lá, mas os brasileiros chiaram. Ele então fez um acordo com seu irmão,
Miguel, que se casou com a filha de dom Pedro, Maria da Glória. Ele deveria
apenas ajudar a sobrinha e esposa, mas Miguel se tornou um rei centralizador e
autoritário para os portugueses.
Em 1831, dom
Pedro I largou o trono para o filho, que tinha apenas 6 anos, voltou para
Lisboa, e montou um exército para combater o irmão. Em 20 setembro de 1834, ele
conseguiu vencer e transformar sua filha em rainha – e dona Maria II iria
entrar para a história como a responsável por colocar uma Constituição acima
dos reis. Pedro morreu quatro dias depois, aos 36 anos. Seu estilo de governar
era respeitadíssimo em toda a Europa.
Fonte:
Aventuras na História
(JA, Mai18)