Tempo Passado
Quando fiz 76 anos olhei
para trás e me assustei com o tempo passado. Foi tão rápido! Eu já tenho essa
idade mesmo?
Lembro-me que um dia comentei com minha esposa, referindo-me a um conhecido comum:
- Sabe, aquele velhinho...
Ao que ela retrucou:
- Aquele velhinho??? Ele tem a
mesma idade que você!
Eu não me considerava ‘aquele
velhinho’, mas os números, os anos passados, eram indiscutíveis.
Não me considerava velho até
então, e nem tinha as características da imagem que eu fazia de um idoso. Velho
para mim era alguém cheio de rugas, meio ‘gagá’, capenga e ranzinza, além de viver
atormentado com problemas relativos à saúde.
Cheguei à conclusão de que esses estereótipos negativos não ajudavam em nada o meu presente, e resolvi reformular o meu (pré)conceito.
Envelhecimento Positivo
Não foi difícil encontrar
pessoas quase da minha idade, ou mais velhas ainda, que tinham uma vida normal,
que passavam uma imagem positiva realizando coisas, buscando mudanças,
influenciando a sociedade ou os grupos nos quais estava inserido.
Eu, de certa forma, já era
assim, embora tivesse tendência a seguir o padrão tradicional. Conclui que
tinha que lutar contra isso, dirigir meu comportamento para o positivo. E, para
tanto, havia necessidade de buscar motivação em ações que ajudassem: participar
em atividades sociais, atividades físicas, buscar informações criativas,
divulgar o que considerava relevante e importante para as demais pessoas, ter
um maior cuidado preventivo da minha saúde etc.
Assim procedendo, fui mudando
aos poucos e com dificuldade, a minha percepção sobre o envelhecimento. Em
decorrência percebi uma melhora, tanto do psicológico como físico.
Estudos mostram que aqueles com crenças positivas sobre o passar dos anos têm vida mais longa e saudável.
Positivo, mas sem radicalismo
Entretanto essa positividade
não pode ser forçada. Não podemos substituir preocupações reais por pensamentos
felizes. As dificuldades reais têm que ser encaradas e enfrentadas. Temos que
olhar para realidade honestamente, e com otimismo.
Eu parei de jogar futebol por
problemas meu joelho direito, e fui jogar tênis. Ainda continuei sentindo
dificuldade em me movimentar na quadra por conta do joelho. Aconselhado por um
colega, fui consultar um médico que me recomendou uma operação para
reabilitação dos ligamentos. Fiz e melhorei. Voltei a jogar tênis. Entretanto, foi
por pouco tempo – voltei a sentir a dor no joelho. Parei de jogar e comecei a
efetuar uma caminhada diária. Durante alguns anos tudo bem; entretanto, voltei
a sentir dores no joelho. Agora, como exercício, ando de ‘bike’, por cerca de
30m diários e me sinto bem. É o que
importa – não consigo mais fazer aquilo, mas posso fazer isso!
‘Não posso mais jogar futebol, tênis, ou fazer caminhadas, como quando tinha 40, 50, 60 anos, mas ainda posso fazer andar de bike’.
Medos
Fim da Viagem
Um dos medos recorrentes, creio que de todos
com idade avançada, é a proximidade do fim da vida. Afinal, resta pouco tempo.
É, não é fácil a consciência que se está
próximo de sair de um lugar conhecido, familiar, e ir, na melhor das hipóteses,
para o desconhecido, o inimaginável.
Entretanto, nesse momento, ajuda se lembrarmos:
“A viagem não acaba enquanto não chega ao seu destino.”
Portanto, vamos em frente, viver da melhor
maneira o tempo que nos resta.
Distanciamento Familiar
Durante a minha infância e adolescência tinha
uns tios e primos que moravam perto da nossa casa, com quem convivíamos muito.
Esse meu tio era muito simpático, alegre. Tinha uma ótica, depois uma papelaria
próxima do colégio onde fiz o ensino médio. Ele era tão ligado a família que
começou a me levar nos serviços de entrega que efetuava por conta da sua
papelaria. Nunca falou, mas intuí depois que ele estava tentando fazer
desabrochar em mim algum interesse pelo negócio, por alguma atividade
produtiva.
Anos mais tarde, já casado, fui visitar meu
primo, filho dele, que hospedava seu pai. Depois de algum tempo, perguntei pelo
meu tio, e meu primo respondeu que ele estava no seu quarto, que andava meio
esquisito, que era melhor deixá-lo quieto. Não pude vê-lo.
Esse é um dos medos relacionados à velhice que
passou a me acompanhar.
A idade pode trazer problemas de audição,
memória, comportamento. Os primeiros a perceberem isso são as pessoas mais
próximas, os familiares. A tendência, é passarem a se distanciar, a ignorar o
‘velho’. Em decorrência, o ‘velho’ vai ficando cada vez mais isolado, distante,
esquisito. Isso não é raro acontecer; o que varia é a escala.
A partir do momento em que me conscientizei
dessa possibilidade, procurei evitar que acontecesse comigo, procurando me
aproximar cada vez mais dos meus, corrigir algum comportamento que eles demonstrassem depreciar, sem violentar a minha integridade,
identidade.
Saúde
Recentemente tive artrose num
dos dedos da mão esquerda. Devo confessar que fiquei com medo de que isso
estivesse sinalizando que meu corpo estaria começando a fraquejar, e que novos
problemas surgiriam.
Fui ao médico e estou seguindo sua orientação para melhorar. Essa artrose é inconveniente, assim como meu problema no joelho direito. Por outro lado, os demais
dedos e o joelho esquerdo ainda estão saudáveis. Portanto, não há razão para
desespero. Tenho mais é que aproveitar o que me resta.
A minha idade tem seus pontos
negativos, mas não me tornou um incapaz. Ainda posso percorrer mais caminhos,
além dos que já percorri.
Benefícios da maior Idade
Paralelamente, para ajudar
a superar essa fase, tenho que dar maior atenção aos benefícios que a idade me
proporcionou. Emocionalmente me sinto melhor do que quando era mais novo; minha
capacidade de cognição, resiliência, aumentou, entre outras coisas.
É claro que a idade também
traz perdas. É comum a perda gradativa da capacidade visual, auditiva, falhas de memória, padecer de doenças mais
frequentemente, maior incidência de falecimento de parentes e amigos, necessidade de sermos cuidados
em alguns momentos etc.
Mas, o importante é não perder de vista que, à medida em que envelhece, você se torna alguém com maior experiência de vida e, consequentemente, com mais sabedoria, capacidade para superar as adversidades, e, inclusive, ajudar as pessoas mais carentes com as quais você eventualmente se relacione.
Se você associar
envelhecer apenas com perda e limitação, você não está olhando para o cenário
completo'. v. Regina Koepp, psicóloga
(JA, Out23)