Os balões nas noites enfumaçadas de junho
Na década de 1960, ainda havia muitas casas com quintal em São Paulo e vários moradores utilizavam este espaço domiciliar para acender fogueiras, e convidar seus parentes e vizinhos para as festas juninas.
A data alusiva ao dia de São João, em 24 de junho, era a mais concorrida e, nestas ocasiões, cada
convidado levava uma guloseima, e todos se divertiam, especialmente as crianças
comendo pipoca, bolo de fubá, paçoca, e outros doces típicos desta época do
ano.
Nesse tempo ainda era permitido soltar balões, embora já houvesse
campanhas contrárias a essa prática.
A tradição veio de Portugal. Lá era comum soltarem 5 balões para anunciar o começo de uma festa junina.
Quando menino, eu via a garotada mais velha, entre 13 e 17 anos, comprando folhas de papel de
seda, de várias cores, para cortar e colar com goma arábica criando balões de
vários tipos.
O mais conhecido era o balão pião, mas havia outros modelos
como o balão caixa, o charuto, mexerica, ou no formato de uma almofada, cujo
nome a criançada pronunciava errado e dizia, ‘balão mofada’.
A tocha era feita com sacos de estopa cortados, enrolados, e
presos a um arame, que depois era instalada no balão; dentro dessa tocha se
colocava parafina.
Minutos antes de soltar, era passado breu sobre a tocha, que
só depois era acendida. Enquanto o fogo aquecia o balão internamente, cada
pessoa segurava uma ponta, até que ele ficasse cheio de ar quente, e com
capacidade para subir ao céu sem a ajuda de mais ninguém.
Só na hora da partida, é que alguém dava um empurrãozinho
para que o balão subisse, seguindo seu rumo, para um destino incerto. Isso tudo
dava uma felicidade imensa.
No dia 21 de junho de 1970 foi quando eu mais vi balões no céu, em toda a minha
vida. Nesta data, que caiu em um domingo, o Brasil conquistou tricampeonato
mundial de futebol, na Copa do Mundo disputada no México.
A seleção brasileira bateu a Itália por 4x1 na grande final, e depois o povo
comemorou à sua maneira, inclusive soltando balões.
‘Havia tantos balões que quase não se via o céu, somente quem
assistiu aquele espetáculo consegue explicar....’ São essas as minhas palavras
colocadas no livro do meu amigo, escritor e apresentador do Jornal da Manhã, da
Rádio Jovem Pan.
Tenho a impressão de que os bombeiros tiveram muito trabalho
naquela tarde e noite, após a grande final da Copa 70 e, talvez, por causa do TRI,
os balões acabaram sendo proibidos em definitivo.
Atualmente, o Artigo 42 da
Lei de Crimes Ambientais proíbe se fabricar, vender, transportar, ou soltar
balões juninos, em qualquer formato, medida ou tamanho.
Tal infração resulta em pena de 1 a 3 anos de prisão, ou multa.
Cerca de 25% dos balões
soltos geram transtornos para os voos e, nestes casos, os pilotos são forçados
a abortar operações de pouso ou decolagem, devido ao risco de acidentes.
Em 2007, quando ainda trabalhava de repórter
aéreo (Geraldo Nunes), demos de cara com um balão junino,
em pleno voo sobre a Marginal do Tietê.
Não houve problemas, o comandante Marcelo Fagundes desviou o
helicóptero com facilidade.
Em pleno século 21,
ainda existem os tais baloeiros, pessoas que ainda fazem e soltam balões, mesmo
sabendo que tal procedimento atualmente é considerado criminoso.
Segundo o Corpo de Bombeiros, 90% dos balões costumam cair com a tocha ainda acesa, ocasionando na
maioria das vezes incêndios, danos à rede elétrica, e até mesmo mortes de
pessoas inocentes.
Balões agora, nem mesmo aqueles pequenos, que no meu tempo
eram chamados de ‘balão lojinha’ ou ‘chinesinho’.
À propósito, um aviso:
“Criança que fica muito
tempo olhando para a fogueira, e depois vai dormir, faz xixi na cama”.
Fonte: Geraldo Nunes | Memórias e Histórias Paulistanas
(JA, Jun22)