No Natal, em Jerusalém, não se celebra apenas a fé cristã. Judeus e muçulmanos também atribuem a essa região um forte caráter religioso –que é, inclusive, motivo de alguns dos conflitos mais sérios que temos nos nossos tempos (reforçados recentemente com a iniciativa controversa do atual presidente americano em reconhecer Jerusalém como capital de Israel).
Nada dessa tensão, no entanto, podia ser percebida ali, no último dia 24,, quando a maior ameaça parecia ser a chuva. Jerusalém em si parecia tranquila, senão um pouco agitada, com seu comércio todo aberto na véspera de Natal. Alguns cartazes pela cidade agradeciam a iniciativa do governo americano (‘God bless Trump, from Jerusalem DC’, ou ‘Deus abençoe Trump’, com o ‘DC’ fazendo referência direta à capital americana, Washington DC). De resto, a atmosfera era de pura comunhão.
Na cidade antiga, uma garoa, no final da tarde, deixava escorregadias as velhas pedras –com marcas de bigas dos tempos romanos. A luz do dia que já havia caído, tornava o caminho ainda mais misterioso.
Entrando pela rua São Jorge –tudo sempre indicado em árabe e hebraico também– e seguindo por vias estreias, encontra-se um colégio copta, um mosteiro ortodoxo grego, uma congregação cristã (com convite para os cultos escrito em português!), a mesquita de Omar, até um arco na rua Santa Helena que leva a um grande átrio, onde está a basílica do Santo Sepulcro.
É nesse lugar que, acredita-se, Jesus teria sido crucificado, sepultado e ressuscitado. ‘Só’ isso... Inevitável então que, diante da modesta fachada, observando o fluxo de fiéis que se debruçam na pedra da unção –onde o corpo de Jesus teria descansado depois da cruz, os que oram na capela de Adão; os que fazem fila para a capela do Anjo –por onde passavam por uma estreita entrada e inevitavelmente se ajoelhavam diante do suposto túmulo de Jesus, os visitantes entrem numa espécie de transe.
Que transe era esse? Era de fé, sim –mas tinha menos a ver com a formação católica do que com a atmosfera geral de uma cidade que concentra tanta religiosidade. Circulando mais um pouco pela cidade antiga, percebe-se novamente essa força maior que é a devoção –independentemente de uma doutrina específica. Todas são relevantes, sabemos, nenhuma mais do que a outra.
Mas, nesta véspera de Natal, nesta terra onde surgiu a tradição desta festa, é impossível dormir sem sentir a força de um homem chamado Jesus. Força essa, renovada na manhã do dia 25, quando se pode observar essas colinas tão sagradas...
Texto: Base crônica jornalista Zeca Camargo | FSP
Imagem: Prédio de Jerusalém visto de frente ao sol, durante um eclipse.
(JA, Dez17)