Outro dia, vendo uma entrevista de uma dessas
atrizes globais da hora, registrei uma fala que achei importante. Ela disse
que, atualmente, a soberba é moda, é "IN", como se diz, e que todos
estão deslumbrados consigo mesmo. Que as pessoas se olham no espelho e dizem: “-
Se eu não fosse eu mesmo, eu me casaria comigo”. Ora, isso tudo seria uma
grande besteira, se não tivesse uma boa dose de verdade.
Recentemente, estive numa loja, numa ótica,
naquele encontro anual - no meu caso bianual, com a receitinha na mão para
atualizar os meus óculos. Naquela conversa importantíssima com o atendente para
escolha de armação, lentes etc., uma deslumbrada entrou na loja. Ela se colocou
entre mim e o moço, com seus sapatos de bicos finos, que faziam com que seus
pés se interpusessem entre ela e aquilo que ela ignorava, e, com uns decibéis
acima do convencional, com um tom de voz impositivo, começou a interrogá-lo
sobre um determinado óculos de sol, da grife tal, como se eu não existisse.
Como um jogador de futebol ou de basquete, usei
meu corpo para proteger a "bola", e me posicionei entre ela e o
rapaz, continuando a falar sobre o que estava falando antes da intempestiva
entrada dela em cena - imagino que minhas costas ficaram a poucos centímetros
da dita. Funcionou, porque após ele ter pedido um ‘minutinho’, que já estava
acabando de atender, ela recuou, sentou-se numa poltrona, e aguardou a sua vez.
Fiquei indignado com o comportamento: “Porque
ela se julgava no direito de ter prioridade no atendimento, sendo que eu já
estava lá?” É simples: ela se acha melhor, com mais direitos do que os outros.
É a isto que se chama soberba.
Na filosofia budista tibetana existe uma figura
chamada "espelho cósmico". Explica que todos os pensamentos e ações
dos seres geram uma energia que é projetada, e retorna para todos. Isto
explicaria porque, de um momento para o outro, todos começam a achar
interessante o mesmo tipo de carro, a terem o mesmos pensamentos sobre este e
aquele assunto, terem os mesmos critérios, a gostarem dos mesmos artistas,
roupas etc. Explica ainda porque algumas invenções ocorram em lugares distintos
do planeta, quase que simultaneamente, mesmo antes da recente facilidade de comunicação.
Dentro deste contexto, entendo que, atualmente,
passou a existir um comportamento comum para um significativo grupo de pessoas:
a febre do culto a si mesmo. A explicação seria o fato de que as pessoas
investem tanto nelas - tratamentos de beleza, fitness, acumulação de riqueza,
dinheiro, poder, instrução, roupas, amizades
etc., a tal ponto que não aceitam serem menos do que as melhores, as
mais importantes, as que merecem todas as prioridades. Pode isso ?!
Talvez eu esteja enganado. Mas, como velejador,
dou muita importância aos sinais: se as marolas estão mais altas, se os
pássaros começam a ficar agitados, se o céu está ficando escuro, se o vento
muda de direção... Acredito que tudo que
vai acontecer, não acontece simplesmente; sinaliza antes.
Pois bem, o fato de muitas pessoas estarem
agindo como a moça que mencionei, deve ter uma razão, e sinaliza que alguma
coisa vem aí na frente. Entendo que isto seja preocupante. Afinal, o que vem aí
na frente? Não cheguei a conclusão
nenhuma, porém, coisa boa não deve ser, considerando o fenômeno com a
consequente desumanização de uma parcela significativa de seres humanos.
Creio que não há muito o que fazer para evitar,
uma vez que se trata de uma onda, que vai vir de qualquer jeito. Resta nos
proteger, e aos nossos, evitando nos deixar levar, fincando os pés no chão dos
nossos princípios, deixar passar.
Porém, enquanto isso, se formos alvo, desse
comportamento, no mínimo, idiota, e, no máximo doentio, como deveria ser nossa
reação, nós, os pretensos normais? Assumi
uma posição: primeiro, não agir de acordo com esse modismo; segundo não aceitar
nada que me desrespeite, que me subestime. Vou exigir ter meu espaço respeitado,
E, se não for, vou manifestar a minha
indignação. Não pretendo abrir mão daquilo que julgue ser meu, de direito.
Mudar, ensinar alguma coisa, não vou. Apenas,
vou me sentir bem melhor comigo mesmo, ao conversar à noite com meu
travesseiro. Outro pensamento que me ocorreu é que, quando meus óculos ficarem
prontos, talvez eu enxergue melhor o que o tal do "espelho cósmico"
está refletindo, mude meu pensamento e até, quem sabe, o meu comportamento.