IA no Cotidiano das Pessoas
O smart speaker o acorda. Imediatamente, você pega o telefone para ler seus e-mails. O smartwatch informa que sua noite de sono foi normal, e que seu ritmo cardíaco está regular. Uma organização distante já sabe, em teoria, a que horas você acordou, como está se sentindo, e o que está lendo. Você sai de casa para o trabalho, e o celular rastreia seus movimentos, gravando as letras usadas em suas mensagens, e o podcast que você está ouvindo.
No caminho, ao longo do dia,
você é capturado centenas de vezes por câmeras de circuito fechado. Afinal a
cidade de Londres tem pelo menos uma câmara para cada dez pessoas, talvez mais.
Quando passa seu cartão no
leitor do escritório, o sistema registra a que horas você chegou. Um software
instalado no seu computador monitora sua produtividade em um nível de detalhe
que inclui até seus movimentos oculares.
A caminho de casa, você
compra o jantar. O programa de fidelidade do supermercado registra suas
compras. Depois de comer, você assiste de um programa de TV; seus hábitos
de consumo são devidamente registrados. Cada olhar, cada mensagem, cada ideia
incompleta registrada em um navegador ou em uma busca rápida, cada passo pelas
movimentadas ruas das cidade, cada batida de coração e noite ruim de sono, cada
compra ou devolução – tudo é capturado, observado, tabulado.
E esse é só um minúsculo
exemplo dos possíveis dados coletados todos os dias, não somente no trabalho ou
no celular, mas também no consultório médico e na academia. Quase todo detalhe
da sua vida é logado em algum lugar, por aqueles com a sofisticação necessária
para processar os dados coletados, e agir a partir deles.
Não se trata de alguma distopia distante. É a realidade diária de milhões de pessoas.
Liberdade e Segurança
Trocar liberdade por segurança é um dilema antigo. Esse é um relacionamento frequentemente complexo e multidimensional, mas a próxima onda aumenta muito as apostas. Que nível de controle social é apropriado para interromper uma pandemia fabricada? Que nível de interferência em outros países é apropriado com vistas ao mesmo fim: as consequências para a liberdade, a soberania, e a privacidade, nunca foram tão potencialmente dolorosas.
Uma sociedade repressiva, de
vigilância e controle é simplesmente outro fracasso, outra maneira pela qual as
capacidades da próxima onda levarão, não ao florescimento humano, mas ao seu
oposto.
Cada aplicação coercitiva,
tendenciosa, e gravemente injusta, será muito amplificada. Direitos e liberdades duramente conquistados
serão removidos. A autodeterminação nacional para muitas nações será, no melhor
dos casos, comprometida. Sem fragilidade dessa vez, somente opressão
amplificada.
Se a resposta para a catástrofe é uma distopia como essa, então não é uma resposta.
Este é um momento único. A próxima onda realmente está vindo, mas ainda não quebrou sobre nós. Embora os incentivos incontroláveis sejam imutáveis, a forma final da onda, os contornos precisos do dilema, ainda serão decididos. Não vamos perder décadas esperando. Precisamos começar a gerí-los hoje.
Fonte: ‘A próxima Onda’, livro de Mustafa Suleyman, fundador da ‘DeepMind’ e da’ Inflection AI’, e Michael Bhaskar
(JA, Fev25)