O ‘R’ caipira do interior de São Paulo, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina deve-se ao fato de que os indígenas que aqui moravam não conseguiam falar o ‘R’ dos portugueses, não havia o som da letra ‘R’ em muitos dos mais de 1200 idiomas que se falavam aqui.
Então na tentativa de se pronunciar o ‘R’, acabou-se criando essa jabuticaba brasileira, que não existe em Portugal.
A isso também se deve o fato de muitas pessoas até hoje em dia trocarem ‘L’ por ‘R’, como em farta (falta), frecha (flecha) e firme (filme).
Com a chegada de mais de 1,5 milhão de italianos à capital de São Paulo o sotaque do paulistano incorporou o ‘R vibrante’ atrás dos dentes, ficando porta como ‘porita’, e em alguns casos até incorporando mais ‘Rs’ do que existem: carro como ‘caRRRo’, se quem falar for de Mooca, Brás e Bexiga, bairros paulistanos com bastante influência italiana.
O ‘R’ falado no Rio de Janeiro deve-se ao fato de que quando a corte portuguesa pisou aqui, a moda era falar o ‘R’ como dos franceses, saindo do fundo da garganta, como em roquêfoRRRRt, paRRRRRi.
A elite carioca tratou de copiar a nobreza, e assim, na contramão do ‘R’ caipira e 100% brasileiro, o Rio importou seu som de ‘R’ dos franceses.
Do mesmo modo a corte portuguesa trouxe o ‘S chiado’ dos cariocas, sendo hoje o Rio o lugar que mais se chia no Brasil; 97% dos cariocas chiam no meio das palavras, e 94% chiam no final. Belém do Pará ocupa o segundo lugar e Florianópolis em terceiro.
As regiões Norte e Sul receberam a partir do século 17 imigrantes dos Açores e ilha da Madeira, lugares onde o ‘S’ também vira ‘SH’. Viviam mais de 15 mil portugueses no Pará, quarta maior população portuguesa no Brasil à época, o que fez os paraenses também incorporarem o ‘S chiado’.
Já Porto Alegre misturava indígenas, portugueses, espanhóis e depois alemães e italianos, toda essa mistura resultou num sotaque sem chiamento.
Curitiba recebeu muitos ucranianos e poloneses, a falta de vogais nos idiomas desses povos acabou estimulando uma pronúncia mais pausada de vogais como o ‘E’, para que se fizessem entender, dando origem ao folclórico ‘leitE quentE’.
Em Cuiabá e outras cidades do interior do Mato Grosso preservou-se o sotaque de Cabral, não sendo incomum os moradores falando de um ‘djeito diferentE’. Os portugueses que se instalaram ali vieram do norte de Portugal e inseriam ‘T’ antes de ‘CH’, e ‘D’ antes de ‘J’. E até ‘hodje os cuiabanos tchamam feijão de fedjão’.
Junto com os 800 mil escravos também foram trazidos seus falares, e sua influência que perdura até hoje em se comer o ‘R’ no final das palavras: Salvadô, amô, calô e a destruição de vogal em ditongos: lavôra, chêro, bêjo, pôco, que aparece em muitos dialetos africanos.
A falta de plurais, o uso do gerúndio sem falar o ‘D’ (andano, fazeno), a ligação de fonemas em som de ‘Z’ (ozóio, foi simbora), e a simplificação da terceira pessoa do plural (disséro, cantaro), também são heranças africanas.
Fonte: ‘Mapa Linguístico do Brasil’, livro de Renato Mendonça; Revista Superinteressante desse mês, Eliana Yunes – AMDG
(JA, Ago18)