A História - Origem e Trajetória da Bebida no Mundo
No entanto, até a sua chegada
ao Brasil, muita coisa aconteceu. Lendas, intrigas políticas, conflitos sociais
e outros fatos polêmicos marcaram a trajetória do grão pelo mundo. Cada país
deixou um legado para a bebida. São muitos anos de história. Vale a pena
conhecer.
Não existem registros
oficiais sobre a origem do café. Sabe-se, entretanto, que se trata de uma
planta nativa das regiões altas da Etiópia (Cafa
e Enária).
Segundo uma das lendas, foi
um pastor etíope, denominado Kaldi, quem percebeu que havia algo diferente nas
plantas da região. Ele havia alimentado suas cabras com arbustos e folhagens
que tinham um fruto amarelo-avermelhado, e notou que os animais ficaram mais
animados e com mais energia, a medida em que mastigavam os frutos.
Intrigado com o comportamento
de suas cabras, ele levou uma amostra da planta para um monge. O religioso,
inicialmente, não aprovou e a denominou como ‘o trabalho do diabo’. A segunda
chance foi dada depois que as plantas foram jogadas na fogueira, e os monges
sentiram o aroma dos grãos torrados.
Uma outra versão dessa história do café, conta que quando Kaldi levou as sementes ao Monge, o religioso, logo demonstrou curiosidade e decidiu preparar uma infusão com as plantas e frutos. Assim que consumiu o preparo, ele comprovou que as plantas causavam uma certa agitação. Considerando os efeitos positivos, o monge passou a consumir o preparo dos frutos avermelhados nas noites de reza.
Alguns registros afirmam que
o consumo de café começou por volta de 575
d.C. – mesma época das lendas sobre a
origem do café. Nessa época os etíopes alimentavam-se do fruto. Aparentemente,
a polpa era consumida nas refeições. Ela era macerada ou misturada em banha.
Com os frutos também faziam suco, que, fermentado, transformava-se em bebida
alcoólica. Suas folhas também eram mastigadas, ou utilizadas no preparo de chá.
Embora a planta tenha origem africana, foi no Iêmen, região a oeste da Arábia, que ela começou a ser cultivada. A história do café, aliás, começa pela criação do nome, que tem origem árabe. Lá a planta era conhecida como Kaweh, e a bebida foi denominada como Kahwah ou Cahue, que significa Força.
A produção comercial do café
também ficou restrita ao Iêmen por um bom tempo. O produto já demonstrava o
potencial econômico, em meio ao desenvolvimento da política mercantilista. As características estimulantes, e a
possibilidade de apresentar novas drogas que fossem também consideradas
mercadorias competitivas, despontava como uma oportunidade.
Na época, a bebida era consumida principalmente por monges em rituais religiosos pois, os auxiliavam durante as noites de reza e vigília noturna.
Afinal, era um produto que estava de acordo com os princípios do Alcorão, que condenava o consumo de bebidas alcoólicas.
Conhecida também como, vinho da Arábia, o café ganhou escala comercial no séc. 14, na região de Moka, principal porto do Iêmen, que foi responsável por um dos maiores cultivos do produto no mundo árabe. E o seu porto, o maior exportador.
Não existiria tanta história do café, se não existissem as cafeterias. Assim, a Turquia marca grande importância nessa trajetória. Pode-se dizer que o país foi responsável pela difusão da bebida no mundo, uma vez que criou, em 1475, a primeira cafeteria: o Kiva Han.
Com a inauguração do espaço,
o café ganhou também um caráter social. Esse conceito popularizou-se em 1574, quando as
cafeterias de Cairo e Meca viraram referência para artistas e poetas.
A excentricidade e o apelo
exótico dos produtos do Oriente, já eram alvo de interesse dos comerciantes do
Ocidente. Desde então, a expansão da
‘bebida preta’, tão apreciada pelos árabes, despertava também o interesse de
cientistas. Conforme ela se apresentava para o mundo, aumentaram os estudos
sobre as propriedades da planta.
Uma das primeiras publicações foi feita pelo botânico veneziano, Prospero Alpino (1553-1616), professor da Universidade de Pádua. Nos livros, ele reuniu relatos científicos sobre o café.
Associada à música e a
encontros sociais, a nova droga do oriente desagradou os religiosos. Na época,
a Europa vivia conflitos como, a Contrarreforma, que queria consolidar
novamente o cristianismo católico. Por ser uma bebida de país muçulmano, o café
era considerado herege. Para tentar amenizar os embates, o Papa Clemente VIII (1536-1605)
até propôs que a bebida fosse batizada com o intuito de torná-la cristã.
Os questionamentos
controversos, sobre a planta serviram de inspiração para Johann Sebastian Bach.
Como resultado, pela admiração ao café, o músico compôs, em 1732, a Cantata
do Café. Alegre e fora dos padrões
religiosos, a composição apresenta uma história de amor, que exalta as
qualidades da bebida.
O aumento do consumo do café
teve também restrições mercantis, afinal, os comerciantes de vinho e queijo,
acreditavam que a bebida era uma concorrente que atrapalharia suas negociações.
Quando o café chegou na
Prússia, o rei Frederico, o Grande (1712-1786), também tentou impedir. No entanto, ele percebeu
rapidamente que poderia tirar proveitos da popularidade da bebida. Ele, então,
criou planos ambiciosos que visavam a monopolização do comércio do produto na
região. Uma das metas estabelecidas era ter uma produção da planta no país.
Felizmente, os esforços que
se opunham a popularização da bebida foram em vão. Por volta do séc. 17, conforme
florescia o Iluminismo e se planejava a Revolução Francesa, as cafeterias
começaram a se desenvolver, juntamente com os ideais que transformariam o
período. Assim, a história do café começava a ganhar forma.
O aumento do consumo da bebida fez nascer a necessidade de processos mais ágeis para a produção de uma boa xícara de café. Enquanto a Europa vivia o início da Revolução Industrial (19), os cientistas começaram a estudar possibilidades de produzir café em máquinas a vapor.
Foi Angelo Moriondo, em Turim (Itália – 1884), quem criou um dos primeiros protótipos que dariam origem a máquina de café. Seu engenho havia sido planejado para reduzir o tempo de produção de cervejas, mas aparentemente, o processo era semelhante. Quando a máquina era acionada, uma caldeira de água era aquecida e o líquido quente era levado até um duto com borras de café, e então, essa solução era levada até uma outra caldeira e o café estava pronto.
Em 1901, Luigi Bezzera (Milão) revolucionou a forma como a bebida seria produzida. Foi ele o responsável pela invenção que, além de agilizar o preparo do café, introduzia o líquido direto em uma xícara. Bezzera aperfeiçoou a máquina criada por Moriondo, introduziu um porta-filtro, compartimentos para os grãos e outras inovações. Notadamente, a máquina rudimentar do cientista italiano era capaz de produzir em segundos uma xícara de café.
Depois disso tivemos muitas evoluções, tantos nas máquinas como em moedores e demais métodos de preparo.
Foram os holandeses, os responsáveis por criar a história do café no mundo. Ao que parece, foram eles os responsáveis transportar as amostras da planta pelo mundo, já que no séc. 16, eles tinham o controle do comércio europeu e os melhores navios.
Tudo começou por volta de 1616, quando um botânico, em Amsterdã, iniciou a produção de mudas de café em pequenas estufas. Em seguida, sabendo da viabilidade comercial, e entendendo as especificações para o cultivo da planta, os holandeses introduziram as plantações do ouro negro nas colônias localizadas nas Índias Orientais.
Progressivamente, as regiões
sob controle da Holanda se configuravam como as primeiras exportadoras de café
comercial. Junto com os franceses e portugueses, eles transportaram o café para
a América.
A chegada do café ao Brasil traz uma série de histórias que narram conflitos de interesses e mistério. A primeira muda da planta veio em 1727, trazida por Francisco de Melo Palhete.
Bandeirante, a serviço da
Coroa Portuguesa, ele vinha da Guiana Francesa e recebeu a planta
-clandestinamente- da esposa do governador francês Claude d’Orvilliers.
Aparentemente, a gratidão da Madame d’Orvilliers já deu o que falar por aqui.
Sempre retratado como um dos heróis da Coroa Portuguesa, o Sargento – Mor Palhete, tinha entre as tarefas o reconhecimento de trajetos fluviais para defesa de território. Ele era um militar graduado que tinha, provavelmente, como objetivos o enriquecimento e o poder da metrópole. Francisco Palhete, foi quem começou o cultivo do café no Pará.
Devido as condições
climáticas favoráveis foi possível manter uma produção voltada para consumo
regional.
Conforme aumentava o consumo
do café pela Europa, a história do café no Brasil ganhava espaço. A produção dos
grãos foi expandida, com a ajuda de João Alberto de Castello Branco. Assim, ele
foi incumbido de começar as plantações na região Sudeste do país. Foi ele quem
trouxe mudas de Coffee Arabica, e introduziu o café no Rio de Janeiro. A partir
desse momento, surgiria um novo ciclo econômico.
Da sua chegada ao Brasil até a consolidação como modelo econômico, passaram-se 100 anos de história do café. As produções de planta no país começaram em modestas lavouras, mas, com o passar do tempo, o chamado ouro negro foi responsável pelo alvorecer da esperança de um recomeço para Portugal.
Foi somente no séc. 19, na região do Vale do Rio Paraíba, que as plantações de café no Brasil ganharam maior representatividade. Isso aconteceu, principalmente, devido à escassez do ouro, e à alta concorrência do açúcar, pois era necessário encontrar alternativas que superassem os problemas econômicos, e contribuíssem para a manutenção da aristocracia. Assim, a expansão do café no Brasil surgiu como uma oportunidade para a continuidade do Império e do Primeiro Reinado.
Enquanto Portugal ainda vivia uma política mercantilista e extrativista, o restante da Europa, já havia passado pela Revolução Industrial e a Revolução Francesa. Esses acontecimentos redesenharam os pensamentos e mapas da região. Os conflitos políticos vividos na região deixavam poucas opções aos portugueses, e a vinda da família real parecia inevitável, pois o Brasil era um dos principais eixos de suas relações comerciais. Quando adentraram as terras brasileiras, o país deixou de ser uma colônia, e se tornou a sede do Império Lusitano.
A vinda da corte foi
decisiva, inclusive, para o desenvolvimento da economia cafeeira e a
industrialização no país. Ela registrou o início da abertura dos portos para o
comércio internacional, e estimulou as atividades industriais que favoreceram,
sobretudo, a urbanização (1830 e 1840).
Foi um período marcado,
principalmente, pela construção de estradas de ferro, e a chegada de
imigrantes. Esses acontecimentos transformaram o Brasil em uma peça importante
no cenário mundial de produção de café.
O Café foi o principal produto de exportação do séc. 19 e do início do séc. 20. As plantações atravessavam as províncias do Rio de Janeiro e de São Paulo. Foi um do momentos mais intensos da história do café no país.
As produções monoculturais, seguiam o modelo plantation, e as fazendas ostentavam uma arquitetura que enfatizava a autarquia dos barões do café. Cada cômodo de uma fazenda de café, portanto, destinava-se a uma etapa de preparo dos grãos.
Inicialmente, os escravos
eram a principal força de trabalho. No entanto, com o aumento da imigração, e a
lei de 1850 – Eusébio de Queirós –, que proibia o tráfico de escravos, houve a
necessidade de mudanças nas relações de trabalho. Aos poucos, as fazendas
começaram a contratar trabalhadores assalariados.
As produções de café, assim
como as condições dos trabalhadores rurais, precisavam de melhorias. Foram as
exigências por uma mão-de-obra mais qualificada, que influenciaram diretamente
na abolição da escravatura (1888).
Os EUA eram os principais consumidores do café brasileiro. Durante a Primeira Guerra, eles estavam em pleno desenvolvimento e mantinham relações comerciais favoráveis com os países europeus. Entretanto, em 1920, as nações europeias já se encontravam reconstruídas, e diminuíram drasticamente as suas importações. O aumento do estoque norte-americano ocasionou no declínio das ações da Bolsa de Valores de Nova York. O fato levou empresários a falência, e aumentou bruscamente o desemprego no país.
A crise americana teve
reflexos mundiais e impactou, inclusive, o Brasil. Assim, as exportações de café diminuíram, e a
queda dos preços do produto era inevitável. Para tentar estancar os preços, os
empresários brasileiros chegaram a comprar e queimar milhões de sacas de café
estocados.
Com fim da crise, alguns
empresários investiram em processos mais modernos de industrialização. Assim, paulatinamente, o Sudeste conseguiu se
restabelecer com produções de café mais modernas.
Atualmente, o Brasil é um dos principais produtores e exportadores de café do mundo. A cafeicultura do país, tornou-se uma das mais rígidas do mundo, pois a produção está constituída em uma regulamentação que respeita as pessoas e a biodiversidade.
São centenas de municípios
que tem o café como fonte de receita. Aqui no país são produzidos,
principalmente, o café arábica e o café robusta (ou café conilon). Além disso, as
plantações representam o principal gerador de postos de trabalho na
agropecuária nacional. As maiores produções estão concentradas em Minas Gerais,
Espírito Santo, São Paulo, Bahia, Paraná e Rondônia.
A CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento), estima que a produção de café de 2022, foi de 50,38 milhões de
sacas, 5,6% superior à do ano anterior.
‘O clima adverso influenciou de maneira negativa as produtividades nos dois últimos ciclos. Em 2020 o desenvolvimento da cultura foi influenciado pela falta de chuvas e, no ano passado, além da estiagem, foram registradas fortes geadas em importantes regiões produtoras’, explica o diretor de Informações Agropecuárias e Políticas Agrícolas, Sergio De Zen.
Fonte: Grão Gourmet
(JA, Abr23)