Renato era um menino com
cerca de sete anos de idade quando começou a frequentar a Escola.
A Escola ficava um pouco
distante da sua casa e ele dependia do transporte público para ir e vir. Inicialmente, sua mãe o levava, até que, num
determinado dia, ele se sentiu preparado para ir sozinho, e foi. Anos mais
tarde, ficou sabendo que, naquele primeiro dia em que foi sozinho para Escola, seu pai
o acompanhou à distância para se certificar que ele conseguiria.
Naquela época criou e
assumiu sua primeira rotina - horários, roupa,
material, transporte, ... -a qual, se cumprisse, tudo daria certo, tudo bem. Ele já era tão responsável que, numa ocasião, estava empinando pipa numa pracinha que ficava em frente da sua casa, quando
percebeu que estava na hora de se preparar para ir à escola. Como a pipa estava
muito distante, e demoraria para conseguir trazê-la de volta, não teve dúvida:
cortou a linha que a prendia e a ficou vendo cair, desaparecer. Em seguida, foi cumprir o
seu horário. No percurso de casa para a
escola, naquele dia, ficou olhando na direção em que a pipa havia caído para, quem
sabe, poder resgatá-la.
E continuou sempre agindo assim. No Colégio Interno onde cursou o Ensino Fundamental 2 (antigo Ginásio), foi um ótimo aluno. Destacou-se nos esportes e exerceu algumas funções administrativas que o
ajudaram a se preparar para a vida profissional futura.
Entrou no Ensino Médio,
no período noturno, e começou a trabalhar. Concluiu o curso, entrou e concluiu
a Faculdade e, em seguida fez pós-graduação, especializações.
No trabalho, bem preparado e responsável, pouco a
pouco, foi galgando postos cada vez mais significativos nas empresas onde trabalhou. Ganhou sempre razoavelmente
bem, construiu patrimônio, casou-se, teve filhos e, mais recentemente, netos.
Sua vida sempre foi
plena, no sentido de que não tinha nenhum horário vago, ou sonho que não
tivesse conseguido realizar. Sonhava sempre com o possível, e suas rotinas o
mantinham sempre ativo e ocupado.
Pouco depois de completar
60 anos de idade, de acordo com a política da empresa onde trabalhava, foi dispensado. Foi então devidamente recompensado pelos anos
que dedicou ao negócio, e pode começar uma nova fase da sua vida. Seus filhos
já estavam formados e eram autossuficientes - não dependiam mais dele para
subsistência. Tinha então alguns imóveis alugados, que, juntamente com a
aposentadoria dele e da esposa, lhe
rendiam uma receita mensal suficiente para cobertura dos gastos normais.
Decidiu que ele e a sua
esposa poderiam morar na casa de praia que tinham num Condomínio bem
estruturado, e, periodicamente, conforme necessidade, poderiam voltar à capital,
onde seus filhos continuariam morando.
Mudaram-se. O início foi
muito difícil. Ele se sentia inseguro,
como se estivesse deixando de fazer alguma coisa que devesse fazer. Frequentemente acordava angustiado, com
palpitações.
Aos poucos, começou a
construir uma nova rotina diária: horário para se levantar, tomar as refeições,
leitura, exercício físico, ..., e o medo foi passando,
Aquele sentimento inicial
não só passou, como, surpreendentemente, percebeu se sentindo melhor do que
antes. Refletindo, concluiu que, ali onde
ele estava agora, era o seu verdadeiro espaço - um espaço que ele próprio
escolheu, onde pode construir uma rotina que priorizava suas necessidades atuais,
gostos, ... – nada lhe havia sido imposto.
Refletindo mais ainda,
foi levado a concluir que ele, como a maioria das pessoas, havia sido levado,
principalmente nos últimos anos, inconscientemente, a ir incorporando hábitos,
atitudes e obrigações diárias que, nem sempre, eram o melhor para ele como
pessoa. A falta de consciência desse
fato, o fez levar uma vida falsa, no sentido em que aquela não era a que
escolheria por opção.
As pessoas são muitas
vezes ansiosas, infelizes, doentes, sem saber o porque. Talvez seja por que apenas estejam cumprindo uma rotina que foram levadas a criar para si, julgando que assim tudo estaria bem, certo.
Ledo engano! A rotina,
muitas vezes é enganosa. Ela é a maior responsável pelo como nos sentimos,
e deve ser, periodicamente, revista,
repensada, mesmo porque todos vivemos em constante transformação. Afinal, a
vida bem vivida é aquela em que as oportunidades de superação, evolução, são
detectadas e aproveitadas.
Diante disso, Renato,
começou a questionar a sua nova rotina.
É, não é fácil viver bem.
Viver bem, conscientemente, exige que se tenha capacidade de determinar e cumprir
os objetivos que realmente têm a ver com o seu momento atual, suas
necessidades, sonhos pessoais. Além disso, há que se ter capacidade e energia
para se mudar o que tiver que ser, e realizar.
“...Desapegar-se é renovar votos de esperança em si mesmo. É dar-se uma nova oportunidade de construir um nova história melhor. Liberte-se de tudo aquilo que não tem lhe feito bem..” Fernando Pessoa
(JA, Mar17)