Leon, 63 anos tinha um defeito na
perna consequência de um grave ferimento que sofreu durante a 1ª. Grande Guerra
Mundial – na época tinha 25 anos e uma brilhante carreira militar pela frente. Atualmente era
um homem muito rico, herdeiro de muitas terras onde se dedicava à exploração de
minérios.
Frequentemente enfrentava os sindicatos que defendiam os mineiros que
trabalhavam para ele em condições insalubres, com pouca segurança e ganhando
muito menos do que mereciam.
Depois de ferido, voltou para a vida
civil e começou a atuar também na vida pública. Como Deputado, nos anos que
antecederam a 2ª Grande Guerra, era favorável aos nazistas e fascistas, pois,
provavelmente devido à formação militar e à sua origem social, acreditava em superioridade racial, e que o povo deveria ser dirigido com autoridade pelo governo, para que fizesse o que dele se esperava.
Coerentemente, era simpatizante dos
nazistas e fascistas, e fez campanha, até o último momento para evitar que seu
país entrasse em guerra contra a Alemanha. Pesou também a sua experiência
anterior nos campos de batalha, e as péssimas consequências decorrentes para
todos os envolvidos. Teve dificuldade de acreditar quando foi informado de que a
Alemanha, inicialmente, tinha se aliado à Rússia, potencial inimigo. Isto significava
que o seu país deveria entrar em guerra para defesa da democracia.
Tinha um filho que, atendendo à
convocação militar, se alistou para
lutar como piloto da Força Aérea, defendendo seu pais contra a Alemanha e a tudo o que ela representava na época. Tinha também uma outra filha que, antes da
guerra, havia se casado com um judeu-alemão - contra a vontade do pai, e que teve que se transferir para a Alemanha com a
família para, por incrível que possa parecer agora, evitar que fossem feitos
prisioneiros. Assim que a Guerra fosse
declarada, como tudo indicava que seria, e que acabou por acontecer, o filho de
Leon poderia passar a jogar bombas contra o país, a cidade, onde estavam a sua
própria irmã e a família.
Um outro filho que Leon que tivera fora do casamento - não reconhecido
legalmente -, nem imaginava então que não fosse filho legítimo do seu
padrasto, a quem chamava de pai. Ele era um militante de direita totalmente
contra a aproximação de seu país com a Alemanha ou Itália.
Oportunamente esteve
em um grande comício defendendo o seu ponto de vista com o seu grupo e, do
outro lado, coincidentemente, estava seu pai, liderando um outro grupo que
representava a elite e o Governo da época, fazendo apologia do nazismo e do fascismo.
Mais tarde, diante do que veio a acontecer, oficialmente eles mudaram de
opinião. Mas, até então, eram a favor.
Se Leon refletisse sobre tudo o que
aconteceu na sua vida, certamente concluiria que suas opções, na sequência, no decorrer dos anos, tiveram como consequência uma série de
ocorrências inter-relacionadas, muitas das quais ele gostaria que não tivessem
acontecido e que poderiam ter sido evitadas se, neste ou naquele momento, tivesse
agido diferentemente. Por exemplo:
- Ter se alistado e ido para a guerra para defender os interesses da sua classe e do país, o deixou mutilado;
- A exploração a que sempre submeteu seus operários, e o fato de não ter reconhecido o filho que teve fora do casamento, estimulou a carreira jornalística da mãe, sua ex-amante, que acabou, juntamente com o filho, por liderar uma forte oposição popular contra a elite da qual ele era membro, comprometendo sua carreira política e pesando significativamente na decisão dos representantes do pais de entrar na 2ª Grande Guerra Mundial.
- Seu filho (legítimo) ter se alistado como piloto da Aeronáutica, o levará combater os nazistas, bombardeando seu território, onde estão residindo sua irmã e família. Todos eles, eventualmente, poderão ser vitimados no processo.
Ele poderia ter evitado as coisas
ruins que aconteceram em sua vida? Difícil dizer. Mas, se a sua formação tivesse sido diferente,
talvez ele respeitasse, valorizasse mais as outras pessoas. E, ao invés de
lutar sempre pelos seus interesses egoístas, se preocuparia mais com os coletivos:
teria sido justo e responsável para com seus operários; teria reconhecido o
filho ilegítimo e amparado a ambos - mãe e filho; teria apoiado o casamento de sua filha, e
eventualmente evitado que ela fosse para a Alemanha; teria sempre
lutado pela justiça e democracia e, quem sabe, ajudado a evitar a 2ª
Grade Guerra, incentivando seu país e aliados a se oporem desde o início ao
movimento que surgiu na Itália e na Alemanha.
Enfim, não é difícil concluir que todos
nós carregamos as nossas maldições e as nossas bênção. Elas são como plantas
que precisam ser cuidadas para florescer.
Depende de cada um, cuidar mais dessas ou daquelas, para formatar o cenário do curso de suas vidas.
Naturalmente, sempre poderão ocorrer
eventualidades que independerão da nossa participação, e que influenciarão
decisivamente o nosso destino. Mas aí, já é uma outra história ...
Os fatos mencionados neste texto foram baseados no livro ‘Inverno do mundo: Segundo livro da trilogia O Século’, de Ken Follett, 2010
Imagem: Glymur, Islândia