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Como escolhi a escola dos meus filhos

Nos últimos dois anos, culminando no fim do ano passado, eu e minha mulher passamos pelo processo angustiante de escolher a escola em que nossos filhos estudarão. Ao longo dos anos, muitos leitores e conhecidos me perguntam onde meus filhos estudam, e, ainda que ache que a escola que escolhemos é pouco relevante para terceiros, por motivos que explicito a seguir, talvez o processo que trilhamos ajude quem está nessa encruzilhada.
O cenário é bem distinto dependendo se o aluno cursará uma escola pública ou privada. Para os pais que matricularão os filhos em escola pública, a sugestão é simples: matricule seu filho na escola com o Ideb mais alto que você conseguir. Como o currículo é teoricamente igual em todas as escolas da rede, o Ideb é o melhor indicador da qualidade da instrução que a escola oferece. Ele é medido para o 5º e o 9º anos, o que permite dar uma boa ideia da qualidade ao longo do Ensino Fundamental.
Para quem pode mandar o filho para uma escola particular, a escolha é um pouco mais complicada. O único indicador objetivo e externo de qualidade é o ENEM (escolas particulares não participam da Prova Brasil e, assim, não têm Ideb). O ENEM é um teste feito para medir o aprendizado do aluno, não a performance da escola. No Estado de São Paulo e em alguns outros em que até recentemente as universidades públicas não usavam o ENEM em seu processo seletivo, muitos alunos dos colégios top tinham pouco incentivo para ir bem no teste, o que reduzia a média da escola. Outro problema do ENEM é que ele só avalia o aluno no último ano do ensino médio. É possível, ainda que pouco provável, que uma escola manipule a entrada de alunos em seu último ano selecionando alunos excelentes, o que faz com que uma escola ruim apareça bem na foto por na verdade ter arregimentado os melhores alunos (digo que isso é pouco provável porque é difícil que os melhores alunos optem por uma escola ruim).
Tudo isso, porém, é de relevância menor, porque o fato que vem sendo demonstrado inescapavelmente pela pesquisa há décadas é que o impacto da escola sobre o aprendizado é menor do que a maioria dos pais imagina. Cerca de 80% da variação de desempenho escolar dos alunos é explicada pelas condições econômicas e, especialmente, culturais/educacionais de seus pais. À escola cabem os outros 20%. Não que isso seja pouco relevante: em um cenário muito competitivo, mesmo 5% de diferença na formação pode fazer a pessoa entrar ou não na universidade ou no emprego dos sonhos. Mas a escola tem menos poder de mudança do que os pais imaginam.
Por isso, minha recomendação principal aos afortunados que podem escolher onde o filho estudará é: prefiram a escola cuja proposta e valores mais se encaixem com aqueles da família. Não existe “a melhor” escola; existe a melhor escola para a demanda daqueles pais. O importante é saber qual o foco principal. É o lado acadêmico? A formação religiosa? É ser bilíngue? É a preparação para a cidadania? O desenvolvimento da criatividade? A segunda coisa importante é saber que nenhuma escola vai alcançar a excelência em todas essas dimensões. Porque o tempo letivo é finito; toda escola tem prioridades. Cabe aos pais saber o que procuram – e ficar de olho aberto em relação às escolas que dizem ser possível assobiar e chupar cana ao mesmo tempo.
O mais importante, especialmente para quem mora em cidade grande, com ampla oferta educacional, é decidir aquilo que você não quer. Ninguém consegue visitar dezenas de escolas, então o primeiro passo é filtrar aquelas que não se encaixam no que você procura.
No nosso caso, tomamos algumas decisões. A primeira é que não seguiríamos o ditado, proferido por alguns conhecidos, de que “escola boa é a escola mais perto de casa”. A escola dos meus filhos é uma decisão importante demais para ficar sujeita à conveniência do meu deslocamento. É verdade que uma distância maior entre a casa e a escola é um fator que impacta negativamente o aprendizado (fontes em twitter.com/gioschpe), mas o jeito de resolver isso é mudando de casa, não de escola. Meu avô se mudou de cidade para que meu pai pudesse estudar em escolas melhores; no meu caso, por já morar em uma cidade com muitas ótimas escolas, só preciso mudar de bairro. Decidimos não circunscrever nossas buscas a nenhuma área específica, portanto.
Por isso, minha recomendação principal aos afortunados que podem escolher onde o filho estudará é: prefiram a escola cuja proposta e valores mais se encaixem com aqueles da família
A segunda decisão importante é que buscaríamos uma escola “normal”. Eu e minha mulher somos judeus e fizemos universidade nos EUA; a maioria dos nossos amigos imaginava que nossos filhos estudariam em uma escola judaica e/ou bilíngue. Negativo. Não escolhi escola judaica porque sou um racionalista, ateu e cosmopolita. Acho que uma escola deve defender a supremacia e a universalidade do saber. Em uma escola religiosa, por mais light que seja, sempre haverá um conflito entre o dogma religioso e a curiosidade ilimitada do pensamento. Como é possível que uma escola ensine ao mesmo tempo que descendemos de primatas e de Adão e Eva? Não pode. Um dos dois está mentindo. Também acho que uma escola deve abrir portas, não construir muros. Não quero colocar meus filhos em um ambiente em que estejam rodeados de iguais, mas sim que aprendam a conviver com a diferença.
Sobre as bilíngues: ainda que seja de fundamental importância o domínio de línguas estrangeiras, não acho que essa deveria ser a principal função da escola. Há muitas maneiras de adquirir fluência em um idioma. Tanto eu quanto minha mulher nunca estudamos em escola bilíngue e entramos em boas universidades americanas. A questão relevante aqui é se o benefício da educação bilíngue compensa os custos. Quais são eles? Há o financeiro: escolas internacionais viraram grife e, como toda grife, podem cobrar um premium por suas marcas. Mais importante: há o desenraizamento. Conheço bastante gente que estudou em escola internacional e domina pouco o português, não conhece a história do país etc. E, ao mesmo tempo, não é americano, nem suíço ou francês. Fica num limbo, não é nem uma coisa nem outra. Alguém já escreveu que árvores sem raízes não dão frutos. Concordo. Espero que meus filhos conquistem o mundo, mas sabendo muito bem de onde vieram. Finalmente, o problema de muitas escolas bilíngues e internacionais é que não têm uma medição externa de qualidade. A maioria dos alunos não faz o ENEM, nem faz vestibulares concorridos. Certamente deve haver excelentes escolas internacionais espalhadas pelo país, mas é mais difícil separar o joio do trigo.
Feitas essas exclusões, como escolher, então, a escola ideal para nós? Meu pensamento foi escolher a escola que melhor suprisse aquilo que nós, pais, não conseguimos suprir, e que não se arrogasse tarefas que são de nossa alçada. Não procuramos, portanto, uma escola que dê uma educação de valores ou que esteja preocupada em “formar o cidadão crítico e consciente”: isso é tarefa nossa, da qual não abrimos mão. Procuramos uma escola forte academicamente, que desenvolva em nossos filhos o gosto pelo saber e a capacidade de raciocínio analítico. Especialmente na área de exatas, já que, se um filho meu não gostar de ler, eu vou mandar fazer teste de DNA…
Usamos o ENEM como o, primeiro corte, procurando as melhores escolas da cidade. (Usamos o ENEM, digamos, “pra valer”: descartamos uma escola que faz parte de uma rede grande e seleciona os melhores alunos de toda a rede e os concentra em uma unidade. Aí o mérito é mais do aluno do que da escola). O segundo corte foi feito utilizando os critérios acima. Selecionamos, então, três escolas para visitar e conversar com a equipe. As três me pareceram academicamente excelentes.
A primeira é muito repressora. Não permite namoros no pátio, política estudantil etc. Nós somos muito liberais e, além disso, acho que dificilmente o pensamento pode ser livre e questionador em um ambiente tão controlado. Não era a escola para a gente, portanto. A segunda é uma escola muito tradicional, linda, liberal, de altíssima qualidade. Poderia colocar meus filhos lá. Só duas coisas incomodavam um pouco. Primeiro, a maioria dos alunos é filha de ex-alunos, o que não só gera um ambiente pouco arejado como ajuda a inflar os resultados do ENEM. Segundo, é uma escola de padres, e, ainda que não fosse estritamente religiosa, essa associação com o plano superior nos causava algum desconforto. A terceira foi a que mais nos agradou. Muito rigorosa academicamente, sem ser repressora. Ótimo resultado no ENEM, especialmente em matemática, uma área em que mesmo as boas escolas brasileiras patinam. Um ambiente estimulante – salas de aula abarrotadas de livros, materiais escolares e trabalhos de alunos. Até o pátio da pré-escola, com coelhos, peixes e tartarugas, é um ambiente de estimulação, de abertura para o mundo. Havia uma consistência muito grande entre o discurso e a prática, e via-se que havia atenção ao detalhe (até o tipo de bolo que o aluno pode trazer em seu dia de aniversário é pensado. Essa atenção ao detalhe é um bom indicador da qualidade de qualquer instituição). E a grande maioria dos alunos entra na escola por sorteio. Ainda que obviamente haja um recorte por renda, já que a mensalidade não é barata, é um bom sinal: é mais difícil ter um bom desempenho acadêmico quando a origem dos alunos não é tão controlada. Essa, então, foi a escola que escolhemos, mesmo que o sorteio não nos tenha sido generoso (levamos dois anos para conseguir entrar).
Por mais que esse processo tenha sido longo e angustiante, sei que ele marca o começo dessa caminhada, não o seu fim. Pretendo ser um pai presente, que acompanha o que se passa no dia a dia da escola e discute com os filhos, como a pesquisa recomenda. Mas de casa, a distância, sem fazer a tarefa dos meninos, deixando que eles quebrem um pouco a cabeça, frustrem-se, que se esforcem muito, que entendam o valor do trabalho, da perseverança, da paciência e do foco. Pelo menos esse é o meu plano racional. Se o coração de pai vai deixar, isso eu conto para vocês daqui a uns anos.
Fonte: Veja (Edição de 19 de fevereiro de 2014)

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